(...)
Fei mal podia acreditar,
flexionando os dedos e as mãos estendidas diante de si mesmo e então olhando
para o ventre, e para as pernas. As lembranças estavam muito confusas, mas
acreditava se lembrar de algo quebrado em seu tronco... Talvez também a perna
direita... E agora...
_ ... Estou curado...
_ Você ficou dormindo nesse
nanorreator por três semanas.
Havia um senhor idoso de ar
gentil diante dele, e Fei tinha certeza de que não o conhecia de parte alguma.
Olhou para a máquina que lembrava um liquidificador e de volta para o
desconhecido.
_ Nanorreator...? Quem é você?
_ Eu...? – deu de ombros e se
afastou um pouco, de costas para Fei – Eu esqueci o meu nome... Algumas pessoas
me chamam Taura...
O homem voltou-se, sorrindo
abertamente para Fei. O rosto estava meio encoberto pelo manto branco que
usava, mas era possível notar que ele estava muito avançado em idade, talvez
fosse a pessoa mais idosa que Fei já vira. Bem, depois da Rainha Zephyr, embora
ela não parecesse ter a idade que tinha. Mas, ainda havia muita vitalidade
naquele senhor, que obviamente sorria ao acenar afirmativamente para ele.
_ E você, parece ter se
recuperado completamente. Aqueles eram ferimentos terríveis, mas talvez sua
juventude e força tenham ajudado. Mas... os ferimentos da sua amiga são mais
sérios, e podem tomar um pouco mais de tempo...
E ele solenemente se afastou,
enquanto Fei se dava conta do outro cilindro no aposento.
_ Minha amiga...? Elly!!
Imersa no mesmo líquido
esverdeado e num cilindro diferente, Elly dormia. Estava flutuando sentada em
posição fetal e parecia inconsciente, e Fei sentia em si uma confusão de
sentimentos ao vê-la naquele estado. Ao menos, pelo pouco que podia enxergar de
seu rosto, ela parecia tranqüila, e não sentindo dor.
_ Elly...
_ Ei! – Taura chamou da porta do
aposento enquanto saía – Pare de ficar olhando para a garota nua e venha pra
cá!
Foi quando Fei se deu realmente
conta do estado de Elly e ficou de costas, o rosto em brasa enquanto Taura
deixava o recinto. Mas, ao se voltar para fazer o mesmo, Fei percebeu alguma
movimentação no cilindro.
_ Elly...?
Era como se ela tivesse se
movido. Continuava inconsciente e flutuando no nanorreator, mas estava voltada
para ele.
_ Fei!!
Citan estava esperando lá fora, e
o alívio em seu rosto era imenso quando ele se aproximou e cumprimentou o jovem
amigo.
_ Doc!!
_ Eu ouvi o que houve de Taura e
vim direto para cá! Rapaz, aquilo sim foi sorte. Foram muito afortunados de ter
descido perto da instalação de pesquisas de Taura...
_ Hm, isso não é instalação de
pesquisas nenhuma – Taura corrigiu – É o ‘esconderijo de um homem’! E você,
rapaz... Citan me falou a seu respeito. Eu fiquei chocado ao ver um casal caído
e encoberto de sangue.
_ Um casal...
_ Seja lá como for – Citan
interveio – Vocês escaparam por muito pouco. Fei, não se esqueça de agradecer a
Taura!
_ Taura, muito obrigado a você –
Fei curvou a cabeça – por ter salvo Elly... Elly e eu fomos feridos com tanta gravidade,
e agora... Afinal, que máquina é aquela?
Ele tornou a olhar para o próprio
corpo, sentindo o local onde tanto doía antes. Parecia difícil acreditar que
realmente estivera ferido, porque não havia sequer uma cicatriz.
_ É chamada de ‘nanorreator’. É
um equipamento que pode reconstruir substâncias em nível molecular. Não apenas
pode curar humanos mas, em teoria, deve também ser capaz de criar muitas
substâncias.
Ao ouvir falar em cura molecular e
criação de substâncias, Fei sentiu sua memória se agitar. Agora se lembrava de
onde ouvira o termo ‘nanorreator’ antes.
_ Não é a mesma coisa que daquele
cara em Solaris...? Digo, é o mesmo que Krelian está estudando?
_ Sim, isso mesmo – concordou
Taura, desviando os olhos – Eu fui a pessoa quem ensinou nanotecnologia a ele.
_ Foi você?
Um sinal eletrônico se fez ouvir
no outro aposento, e Taura voltou seus olhos para a porta.
_ Não deveríamos desperdiçar
tempo falando de um assunto tão pouco importante. Parece que o tratamento dela
terminou. Ah, você não precisa vir – ele acrescentou, ao notar que Fei parecia
disposto a acompanhá-lo – Apenas espere aqui.
Fei se manteve em silêncio,
pensativo enquanto esperava, e Citan percebeu que seu jovem amigo estava imerso
em reflexões. E assim ele se manteve até que a porta se abriu e Taura retornou,
com Elly caminhando diante dele e parecendo tão ilesa quanto o próprio Fei.
_ Elly!
_ Fei... Eu...
Os dois olharam de um para o
outro nos olhos em silêncio pelo que pareceu um tempo muito longo. Enquanto
estavam inconscientes... algo acontecera. Algo que dançava nos recessos das
memórias de ambos, algo muito importante e profundo, que dizia respeito aos
dois. E não havia como descreverem o alívio que cada um sentia por ver o outro
plenamente recuperado.
_ Aham! – fez Taura,
interrompendo o silêncio – Agora, por que os dois não vão respirar um pouco de
ar fresco lá fora? Isso deve acalmar o choque da mudança.
_ Eu sabia que era você...
_ Fei...?
Estavam do lado de fora da casa
de Taura, na floresta. Era dia claro e no entanto, estava consideravelmente
escuro ali; as copas das árvores eram amplas e próximas e escondiam muito da
luz do sol, como na Floresta das Trevas onde ele a conhecera. Ou... onde a
reencontrara...
_ Quando você entrou na sala
agora a pouco – ele deu as costas a ela, parecendo encabulado – Eu tive medo de
que você pudesse ter esquecido de mim e de todo o resto...
_ O que quer dizer...?
_ Digo... porque... Elly, você parecia
um pouco diferente de antes...
Elly também deu as costas a ele.
Agora ela também estava sem jeito.
_ O... O meu rosto mudou?
_ Não, não é isso – ele voltou-se
para ela – Foi mais como se... Bom... Eu quis dizer que sua atmosfera, ou
impressão está diferente... Só um pouquinho... Mas... eu senti algo familiar...
Ele tornou a esconder o rosto, e
baixou os olhos. Era estranho, sabia do quê estava falando, mas não sabia como
dizer aquilo. Principalmente, não sabia como dizer sem parecer ter
enlouquecido.
_ Eu me senti do mesmo modo como
quando conheci você... Uma sensação peculiar como se já tivéssemos nos
encontrado antes, em algum lugar...
_ Fei...
Elly também se afastou um pouco,
sem se voltar. Quase parecia que ele também...
_ Sim, o que foi?
_ Eu não me lembro muito do que
aconteceu depois que fomos alvejados...
_ Acho que é melhor assim.
_ Mas eu ouvi alguém chamando o
meu nome – Elly voltou-se para ele, muito séria, e sabia que de algum modo ele
saberia do quê ela estava falando – Eu senti que estava coberta com algo muito
caloroso... Me lembro disso com clareza.
Ele não encontrava nada para
dizer. Era estranho. Era como se houvesse muito a dizer, mas não com palavras.
_ Obrigada, Fei.
_ Elly...
Cada um deu um passo na direção
do outro, ambos olhando diretamente nos olhos. Era sério, muito sério. Estarem
juntos ali, vivos apesar de tudo, era algo de extrema importância. Era o que
tinha de ser.
_ Fei...
_ Ei, já deu a hora de vocês dois
voltarem para dentro! – gritou Taura lá embaixo – Há uma coisa importante de
que precisamos falar com vocês!
Os dois olharam ao redor como se
despertassem de repente, e Fei tornou a olhar para Elly. O momento passara,
sabia. Ela suspirou profundamente e ele respondeu gaguejando que já estavam
indo.
Fei e Elly retornaram à câmara do
nanorreator, e Taura olhou para ambos com um sorriso satisfeito.
_ Como se sentem agora? O ar
fresco da floresta deve tê-los refrescado um bom bocado, hein?
Fei e Elly se entreolharam. Fei
só podia supor, mas pela expressão de Elly ela partilhava a opinião dele, de
que Taura podia muito bem ter esperado mais uns dois ou três minutos antes de
chamá-los de volta. Sem fazer qualquer conta da troca de olhares, no entanto, o
ancião pigarreou e prosseguiu:
_ Seja como for... É sobre a
remoção do selo... Eu descobri que ele pode ser liberado usando-se a
nanotecnologia que regenerou vocês dois. Os nanomontadores estão selados neste
casulo.
_ Se ao menos pudéssemos
espalhá-los por sobre o mundo todo – murmurou Citan, e Taura voltou-se para
ele.
_ Há uma antiga instalação
militar nas proximidades... Podemos ser capazes de utilizar o ‘Dispersor em Massa’
localizado lá para lançar este casulo até a atmosfera superior. Uma vez que os
nanomontadores sejam liberados lá em cima, as correntes convergentes devem
bastar para espalhá-los pelo mundo!
“Eu gostaria de poder fazê-lo –
ele acrescentou, voltando-se para Fei – mas estou ficando velho demais para
esse tipo de coisa. Além disso, diz respeito ao seu futuro. Um velho não
deveria se intrometer. Vocês, jovens, devem fazê-lo por si mesmos! Aqui”.
E entregou a cápsula com os
nanomontadores que, caso a missão fosse levada adiante com êxito, liberariam os
Limitadores de cada pessoa em Ignas. Fei olhou para o objeto do tamanho de um
controle remoto, imaginando como algo tão pequeno poderia afetar o mundo
inteiro.
_ E, naturalmente, não estou
pedindo que faça isso de graça – Taura acrescentou, retirando algo do bolso –
Experimente essa braçadeira.
Sem entender, Fei colocou no
pulso esquerdo o que parecia ser apenas uma pulseira de cor escura.
_ O que é isso? – perguntou
Citan.
_ Um ‘Dispositivo de Controle das
Emoções’ no qual nanotecnologia é aplicada – Taura explicou – Desta máquina em
forma de braçadeira, nanomáquinas são infundidas através de sua epiderme até o
seu cérebro. Lá, elas refinam as substâncias intracerebrais SSRI, tais como a
Serotonina, que controlam as emoções.
Taura voltou-se. Fei continuava
olhando para ele com dúvida, e ele acenou negativamente.
_ Bem, eu suponho que seja
razoavelmente difícil que você compreenda... Mas, de forma resumida, significa
que a manifestação de sua segunda personalidade, ‘Id’, pode ser suprimida.
_ Id...
Fei desviou os olhos e baixou a
cabeça. Sim, era forçado a retornar à batalha. E Id estava esperando exatamente
por isso para vir à tona novamente. Talvez, dessa vez, em definitivo. Ele
sentiu a mão de Elly em seu ombro e perguntou-se se iria colocá-la em risco
outra vez.
_ Bem, é claro, isso tudo é
teórico... – Taura prosseguiu – Ah, e eu fiz mais uma coisinha, também...!
Instalei o mesmo sistema de controle no seu Gear...
_ Você quer dizer que isso pode
libertar Id à vontade...? – Citan perguntou, incrédulo.
_ Sim. Eu o chamo ‘Sistema Id’.
Mas, naturalmente, não deve ser utilizado indiscriminadamente – Taura
acrescentou, uma nota de aviso em sua voz – Use-o apenas como um último
recurso.
_ Elly, Doc... Eu...
Fei estava dividido entre a
necessidade de agir e o risco que isso envolvia. Eles, os amigos próximos,
seriam os primeiros a se ferirem caso algo saísse errado. E não acabaria neles;
ele ainda se lembrava do que lhe haviam dito sobre Solaris.
_ Fei, não havia nada que você
pudesse fazer – Citan comentou – Embora, isso nunca tornará a acontecer com a
tecnologia de Taura. Ele é um dos três Sábios de Shevat.
_ Se você acredita ou não, cabe a
você – Taura deu de ombros, e Fei olhou para a braçadeira em seu pulso. A idéia
de usar o poder de Id e manter-se no controle podia ser a resposta a várias
situações de crise... mas o próprio Taura admitia que não era mais do que
teoria. Se algo saísse errado...
Então ouviram a porta de entrada
do outro aposento abrir e fechar-se, e Taura olhou naquela direção.
_ Ah? Parece que temos um
visitante!
_ Fei...! Nós temos problemas!!
Era um emissário de Shevat. Longe
de parecer preocupado com o fato de Fei estar livre, no entanto, ele vinha
pedir ajuda.
_ Hoje, um acordo de paz entre
Aveh e Kislev está sendo assinado em Shevat... Mas, as armas móveis de Solaris
estão se aproximando de Shevat enquanto falamos! Por favor, nos ajude!
_ Isso não tem nada a ver com
este jovem!! – Taura interrompeu, passando adiante de Fei e Elly e se colocando
entre eles e o emissário, que ficou tremendamente surpreso.
_ Taura!!
_ Vocês me dão nos nervos por
serem tão egoístas. Citan me falou de vocês. Vocês aparecem depois de descobrir
que Id agora está sob controle... Não têm vergonha? Vocês não mudaram nada
desde aquela época! Só se importam consigo mesmos! Fei! – ele voltou-se para o
rapaz – Não precisa escutar essas pessoas que um dia tentaram matá-lo!!
_ Mas...
Ele também pensava assim, mas de
algum modo, aquilo não parecia correto. Parecia errado não tomar atitude alguma
enquanto Solaris se lançava ao ataque e, mesmo já tendo outra missão diante de
si, ele...
_ Por favor vá. Eu irei até o
Dispersor em Mssa...
_ Elly?
_ Não importa o que aconteceu
antes – Elly estava de costas para ele, se afastando – Shevat precisa de sua
ajuda agora. Mesmo que você esteja salvando algumas pessoas egoístas... Ainda
há o mundo e seus países, com muito mais gente inocente. Por favor, não se esqueça
disso.
Ela voltou-se para ele, olhando-o
nos olhos, e um entendimento mútuo passou entre os dois.
_ Bart e seu pessoal estão
lutando para proteger essas mesmas vidas, não estão? Então, por favor, vá
ajudá-los!
_ Tem certeza disso? E quanto a
você?
_ Não se preocupe comigo. Eu vou
conseguir de algum jeito.
_ Mas, você sozinha...
_ Eu acompanharei Elly – Citan
assegurou – Você não precisa se preocupar. Eu trouxe comigo o meu próprio
Omnigear.
_ Seu próprio Omnigear...? – Fei
voltou-se para Citan, admirado, e o catedrático sorriu.
_ Sim, meu Omnigear, ‘Fenrir’. É
o mesmo que eu trouxe de Solaris. Eu o deixei com Gaspar para o caso de uma
emergência.
_ Doc... – e Fei concordou –
Muito bem. Por favor, tome conta dela por mim. E Elly, tome cuidado.
_ Ficamos realmente gratos pela
sua bondade, Fei!! – o emissário exclamou, e Taura deu-lhe as costas.
_ Hmph! Se enxerguem.
_ Meu destino é Ignas, certo? –
perguntou Fei, e o emissário confirmou.
_ Sim. O objetivo do inimigo é
destruir as cidades em Ignas. Já destruíram metade de Bledavik e provavelmente
alcançarão Nisan em cerca de quatro horas. Shevat vai tentar afastá-los
com todo o poder que tem!
_ Quatro horas – Fei ponderou –
Isso é muito em cima!
_ Não precisa se preocupar –
Taura sorriu – Balthasar e eu consertamos seu Gear com as nanomáquinas. Está
muito mais poderoso do que jamais foi antes. E digo mais, você pode chegar lá
na metade do tempo.
_ O quê? O Velho Bal está aqui?
_ Emeralda também está aqui –
Citan ajeitou os óculos, e todos foram para fora, onde Weltall esperava por
Fei. Era o mesmo Gear de antes, mas não era exatamente o mesmo. As aletas em
suas costas assemelhavam-se mais com asas, ele ganhara uma crista maior sobre a
cabeça e um ar mais imponente. Parecia exalar confiança.
_ Isso é incrível...! – murmurou
Fei.
_ Nos encontramos novamente.
Balthazar veio de trás do Gear e
acenou solenemente a cabeça para Fei, voltando-se então para olhar o Gear negro
atrás de si.
_ O hospedeiro para o espírito do
assassino de deus... Não achei que eu voltaria a trabalhar nele novamente...
_ Mas – Fei olhou para Balthazar
e Taura – por que vocês dois estão me ajudando...?
_ Há algumas coisas que não se
pode explicar com as palavras – Taura deu de ombros – Destino. Você vai ter que
ver o que vai acontecer com seus próprios olhos.
_ Fei... Indo?
Emeralda surgiu de algum lugar
por trás do grupo. Fei voltou-se para ela e confirmou.
_ É, isso mesmo. É melhor eu me
apressar!
Sem mais uma palavra, Emeralda se
afastou.
_ Ei, pra onde você vai?
_ Fei, por favor se apresse! –
pediu o emissário.
_ Ah... c-claro.
Os jatos às costas de Weltall-2
foram ativados e, por um instante, ele se manteve onde estava como se apenas se
aquecesse. Subitamente, o Gear negro curvou os joelhos e saltou, ganhando os
ares velozmente. E sobre a casa de Taura, Elly e Citan observavam a partida.
_ Tem certeza de que você quer
seguir adiante com isso? – Citan perguntou – Você queria viver de forma
tranqüila, longe do campo de batalha, não queria?
_ ... Eu percebi a mim mesma
fugindo da realidade – Elly murmurou, dando as costas a Citan – No início, eu
achei que minha situação era parecida com a dele. Eu achei que Fei entenderia
meus sentimentos... Eu não sabia se meu amor por ele era real... Eu podia
apenas estar desesperada depois de perder minha mãe e meu pai...
_ Elly...
_ Apesar de tudo aquilo – ela
voltou-se para Citan, os olhos ainda baixos – eu talvez ainda o ame... É por
isso que, eu quero ver o que Fei pode fazer e o que eu posso fazer. Quero que
fiquemos separados e pensemos sobre nós mesmos outra vez. Quero entender...
como eu realmente me sinto...
Ela desviara os olhos, olhando
para algum ponto adiante na mata. Após um instante de silêncio contemplativo,
Citan comentou:
_ Você mudou muito, Elly. O que
aconteceu a você nessas últimas três semanas?
_ Mesmo? – ela voltou-se,
sorrindo fracamente para Citan – Eu não acho que mudei...
_ Sim, você mudou. Eu diria...
que você amadureceu. Como uma mãe...
_ Como é que é! – ela ergueu os
olhos, agora tremendamente corada – Eu só tenho dezoito anos! Não estou nem
perto da idade de ser sua mãe!
_ Desculpe – Citan riu – Você me
deu essa impressão, foi só isso.
Ele continuou rindo por mais
algum tempo, e Elly sacudiu a cabeça. Fosse como fosse, os eventos já estavam
se dando. Não podiam esperar mais.
_ Seja como for, Citan, eu estou
indo.
_ Muito bem – ele concordou –
Seguirei você assim que terminar por aqui...
_ Eu, eu vou, também.
Emeralda se aproximara enquanto
os dois conversavam, e apesar da aparência infantil, seus olhos deixavam bem
claro que aquilo não era um pedido; era um comunicado.
_ O quê?
_ Eu vou!
_ Emeralda – Elly abaixou-se,
ficando no mesmo nível que o rosto da menininha – eu não posso levar mais
ninguém comigo para uma coisa dessas. Vou ficar bem se for sozinha.
Emeralda deu as costas a ela e
cruzou os braços, repetindo:
_ Se Elly vai, eu vou também.
Emeralda tem que ir com você.
_ Emeralda...?
_ Não! – ela voltou-se e gritou –
Emeralda vai também!
Elly olhou para a menininha sem
saber o que fazer. Emeralda já se provara em batalha, mas aquilo não seria um
passeio, e ela não achava que poderia tomar conta de si mesma e da outra quando
estivessem lutando. E Citan sugeriu:
_ Por que não deixá-la ir? Eu
estou certo de que Solaris tem um pressentimento quanto ao Limitador. Eles
podem interferir, então você talvez se sinta insegura quanto a ir sozinha. Eu
acho que Emeralda é perfeita para esse trabalho. Além do mais – ele acrescentou
num tom mais baixo, enquanto Elly se voltava para ele – ela vai querer ir, não
importando o que diga. Cuide dela até que eu possa me juntar a vocês, por
favor?
Elly suspirou e então sorriu e
acenou que sim, tornando a se abaixar para falar com Emeralda.
_ Tudo bem, você venceu. Vamos
ajudar uma à outra, tá bem?
_ Eu posso fazer isso sozinha – a
menina retrucou, tão confiante quanto Rico – Você fica olhando.
Em sua biblioteca, Taura
verificava alguns livros e anotações de forma distraída. Ao menos, era o que
parecia. Mas ele não estava tão desatento que não pudesse notar o momento exato
em que o outro entrara, sem usar a porta. O único sinal de que ele percebera a
presença do intruso foi parar de mexer em seus livros.
_ Como eu pensava – ele murmurou
sem se voltar – Então, foi você quem trouxe Fei e a garota dele até mim... Eu
percebi no momento em que vi os dois juntos. Aliás, como eu poderia deixar de
notar... Eles eram tal e qual você e ela. Sim, o mesmo que vocês dois pareciam
naquela época... Certo, Lacan?
Ele finalmente se voltou. De pé,
semioculto nas sombras mal iluminadas pela vela, Grahf olhava para Taura com os
braços cruzados e em completo silêncio.
...ENQUANTO PAIXÃO QUEIMA EM SEU CORAÇÃO