Capítulo 34: Protejam Nisan
Nisan estava em silêncio, demais
até para uma cidade sagrada. Fei, Bart e Chu-Chu estavam ocultos atrás de um
dos muros dos jardins, e a ausência de movimento era enervante.
_ (A Cidade está terrivelmente quieta
por alguma razão...) – Fei comentou baixinho. Bart concordou.
_ ( Também não consigo ver
ninguém da população.)
_ (Vai ficar tchudo bem – Chu-Chu
tranquilizou – Tem um buraco secreto. Foi ichu que eu ouvi).
O trio continuou a observação por
mais alguns minutos, até que se voltaram ao ouvir passos. Era Sigurd, que fora
fazer um reconhecimento da área com o restante do grupo.
_ (Como é que foi lá, do seu
lado?) – perguntou Bart.
_ (Toda a área ao longo das
estradas também... Tudo estava tão quieto quanto aqui) – Sigurd respondeu.
Fei voltou-se para Bart. Cabia ao
amigo tomar uma decisão quanto ao que fazer. De braços cruzados e rosto baixo
por um instante, o pirata considerou suas opções, e então tornou a olhar para
Sigurd.
_ ... (Qual sua opinião sobre
isso, Sig?)
_ (Pelo pouco que vi – Sigurd
meneou a cabeça – não há muito mais que eu possa dizer.)
_ (Ou eles ainda não encontraram
aquilo que estão procurando... – ponderou Bart – ou já descobriram, mas
acabaram deixando alguns guardas pra trás... Seja lá como for, ainda precisamos
verificar a segurança dos habitantes antes de sequer pensar em nos revelar).
Sigurd, Fei e Chu-Chu concordaram
com um aceno de cabeça, e Fei não deixou de notar a melhoria. Ele
principalmente, que fora por duas vezes abatido por tiros precipitados de Bart,
sorriu ao notar que o amigo finalmente tinha aprendido a pesar suas ações antes
de agir. E Bart tornou a voltar-se para Sigurd.
_ (Ei! Aliás, como é que a Margie
tá lidando com isso?)
_ (Até onde se percebe, ela não
parece estar muito diferente de seu ‘eu’ costumeiro. Mas, como ela está se
sentindo por dentro... Bem, quem vai saber...).
_ (Sério...? – Bart acenou com a
cabeça, parecendo pesaroso – Valeu por tomar conta dela, Sig).
_ (Sem problemas. De qualquer
forma – Sigurd voltou-se para partir – devo retornar, para comandar a outra
unidade).
_ (Beleza. Vê se se cuida!)
Sigurd ainda verificou os
arredores por um momento, certificando-se de não ser visto, e então partiu.
Quando ele se foi, Bart comentou meio que para si mesmo:
_ (Margie... Achei que tinha dito
pra ela ficar quieta na nossa nave).
_ (Ela provavelmente não
conseguia ficar calma, parada dentro da nave sem fazer nada – Fei lembrou).
_ (É, eu sei, mas...)
Bart suspirou, dando de ombros.
Já estava preocupado demais com o povo de Nisan e com o fato de não conhecer
toda a situação, e a vinda de Margie não auxiliava em nada, pois agora tinha
uma preocupação a mais. Mas, talvez, não pudesse ser evitado.
_ (Bom, ela já veio até aqui, não
dá pra determos ela agora. Beleza, então... Vamos andando.)
Os guardas de Aveh foram
surpreendidos quando o trio saltou de seu esconderijo sobre eles. O primeiro
grupo, apanhado totalmente de surpreso, foi dizimado pelo ataque rápido de Fei,
Bart e Chu-Chu.
Fora um ataque coordenado, com os
membros da tripulação de Bart e também seus companheiros de viagem caindo de
surpresa sobre os soldados invasores, espalhados por toda Nisan. A intenção era
neutralizar todas as tropas de vigias antes que qualquer represália pudesse ser
tomada contra a população.
Fei saltou sobre um dos guardas,
atingindo-o com os pés e então vendo que Bart, ocupado com outro soldado, não
reparara na escadaria por trás de si.
_ Bart, cuidado! Sua retaguarda
está aberta!
Chu-Chu saltou sobre os ombros de
Fei e rolou escada abaixo, atingindo o guarda e seu rifle como se fosse uma
bala de canhão, um instante antes que atirasse.
Preocupado, Fei foi até a
escadaria para ajudar, mas Chu-Chu acenou animadamente para ele lá de baixo.
_ Tchudo bem por aqui, Fei! Achu
que esse era o último desse lado!
_ Ah... certo, então. Bom
trabalho, Chu-Chu. Bart, e você?
_ Ela deve ter razão, Fei – Bart
olhou ao redor – Tudo limpo. Sig, você tá aí? Fala comigo, como tá a nossa
situação?
_ Informando, jovem mestre –
Sigurd respondeu pelo comunicador – Nosso ataque foi rápido e preciso o
bastante. Nenhum dos soldados deixados na cidade conseguiu causar qualquer dano
à população.
_ Bom. E o nosso pessoal?
_ Alguns ferimentos leves na
batalha, que não puderam ser evitados, mas todos estão bem.
_ Boa, conseguimos libertar
Nisan, então! Mas... – e Bart tornou a parecer preocupado – O Jasper de Fatima
e os tesouros lendários da família real... Esses continuam em perigo.
Enfim, ao menos, Bart podia
sentir que a espera terminara. Havia chegado o momento de jogarem sua última
cartada, e as verdadeiras intenções de Shakhan seriam trazidas à luz.
Sigurd caminhava pelas ruas de
Nisan. Detendo-se diante da praça principal, ele olhou para os lados. O
silêncio continuava.
_ Nenhum sinal de habitantes...
ainda.
Enquanto Sigurd fazia a ronda pela
cidade, Fei e seus companheiros estavam reunidos na sala de conferências de
Nisan, o mesmo local onde, no que parecia uma vida atrás, eles tinham planejado
o malogrado ataque a Aveh. A busca pelos civis não fora de todo perdida; Irmã
Agnes da Seita de Nisan fora descoberta, e Margie reunira-se a ela assim que
soube, cheia de preocupação.
_ Irmã, você está bem? Está
ferida?
_ Eu estou bem. Marguerite e
Bartholomew, eu sinto muito...
Foi quando Sigurd adentrou a sala
do conselho, e a pergunta nos olhos de todos foi respondida com um aceno de
cabeça.
_ Eu tomei algumas tropas e
vasculhei a área, mas não pude encontrar ninguém.
_ Sério? – Bart tornou a parecer
preocupado. Não tinham permitido qualquer tempo aos guardas deixados ali para
agir, ou alertar seus superiores, mas era questão de tempo até Shakhan perceber
que não estava mais no controle da cidade. Era preciso que encontrassem o povo
com urgência.
_ Anteriormente – Irmã Agnes
falou, e todos se voltaram para ela – Depois que se foram... mais da metade dos
cidadãos partiu de Nisan. Depois daquilo, a posição de Shakhan no país ficou
comprometida, e então... ele não se importou mais com reputações e atacou esta
terra.
_ Entendo – Citan ponderou – Um
último plano desesperado para reverter a situação...
_ Irmã – Bart indagou – Eu
presumo que as pessoas que restam na cidade estão...?
_ Sim – Agnes confirmou –
Escondidas no mausoléu.
_ Mausoléu? – Fei estranhou –
Esconder-se num túmulo?
_ As Grandes Madres e Reis de
Aveh de outrora são reverenciados lá – explicou Margie.
_ Não é só um túmulo qualquer,
nem nada do tipo – falou Bart.
_ Bartholomew, sobre aquilo... –
todos se voltaram para Agnes – Shakhan e o Jasper de Fatima... Ele está atrás
do Tesouro de Fatima.
_ Tesouro? – Citan indagou – Se
ele quer o tesouro, tá fazendo o que, atacando este lugar...?
Foi como se alguém lançasse uma
luz nos pensamentos de Bart, que de repente atinou com algo que não lhe
ocorrera até então.
_ Ahh... É que, na verdade, o
Tesouro de Fatima está no mausoléu! Tinha até o testamento do pai lá, mas eu
não contei a ninguém.
_ Tesouro... – Fei lembrou-se –
Está falando daquela coisa nos pergaminhos de figuras que você me mostrou
antes, na sua base?
_ Isso. Se seguir aquela lenda,
você supostamente pode colocar suas mãos em algum grande poder.
_ Devemos detê-los de algum modo
– frisou Sigurd. E Bart pareceu um pouco menos preocupado.
_ Sem problema. O Jasper está...
_ Eles planejam usar as retinas
da antiga Madre – Agnes interrompeu, parecendo pesarosa. E causando horror a
Bart.
_ O... O quê?!
_ Remover a retina da falecida
Madre, e quebrar o selo – Agnes tornou a dizer, de olhos baixos.
_ Usar o corpo da mãe da
Margie...?
_ O corpo da mamãe...!!
_ Eu sinto muito – Agnes explicou
– Eles usaram cidadãos inocentes e seguidores da seita como escudo. Não havia
outro meio. A verdade que ouvimos previamente de Margie sobre a verdadeira
forma do Jasper e como é usado. Eles agora já sabem... Eu realmente sinto
muito.
Agnes parecia não poder se
perdoar, mas Bart acenou com a cabeça.
_ Bom... Eu não culpo você. Eles
tinham reféns!
_ Espere um momento – pediu
Citan, tentando entender – Retinas... Do que estão falando?
_ O Jasper de Fatima são as
pupilas de azul topázio da Dinastia Fatima – Bart explicou – Em outras
palavras... nosso padrão retinal. As portas até o tesouro são abertas por
isso... Ou assim é dito.
Todos tinham suas atenções
voltadas para ele. Sim, isso explicava a profanação dos mortos de que Agnes
falara. E Bart continuou, tornando a acenar com a cabeça.
_ No entanto, ninguém jamais o
usou. Não é pra ser usado em conflitos menores. As portas só devem ser abertas
quando o reino estiver realmente em perigo. Então nem eu, nem meu pai, nem meu
avô, nem mesmo meu bisavô, jamais o usamos.
_ Entendo – Citan ponderou –
Então essa é a verdadeira forma do Jasper...
_ Maldição!
Margie voltou-se para Bart, que
apertara os punhos de raiva.
_ Aquele urubu velho e careca,
ele quer profanar o cadáver de uma pessoa sagrada? Isso é impensável!
_ É um segredo guardado de perto
– Citan observou com ar grave – mas as pessoas do ‘Ethos’ não são homens
sagrados. Eles simplesmente supervisionam.
_ É, claro que eles não iam ter
problema nenhum com isso! Vamos Bart! – Fei apoiou – Antes que o mausoléu seja
devastado.
_ Isso aí!
_ Jovem mestre! Eu tenho uma proposta.
_ Hã? O que foi, Sig?
_ Atualmente, Aveh está em
confusão com Shakhan correndo para todos os lados. Seria muito fácil derrubar o
centro de comando sem qualquer unidade da Gebler por perto – ele lembrou – Será
a melhor ocasião para fazermos nossos retorno à capital.
_ Essa é uma boa idéia – apoiou
Citan – Shakhan está, muito provavelmente, pensando no Jasper de Fatima como
seu último recurso. Enquanto impedimos que o tesouro do jovem caia nas mãos de
Shakhan... uma força separada retornará à capital. Ele então não terá mais lugar
algum para onde fugir.
_ Eu entendi... – Bart concordou
com a cabeça, abrindo um sorriso lento – Parece bom. Podemos acertar todas as
contas com um único tiro! Tá certo, vamos nos dividir; eu pego o mausoléu. Vou
levar Fei e... que tal você, Citan?
_ Se possível, eu gostaria de
voltar à capital com Sigurd – ele declinou – Dois ex-solarianos vão destronar o
‘Ethos’... Quão irônico.
_ Certo, isso vai ser legal.
Então, que tal você, Billy? Você disse que queria conhecer mais de Nisan.
_ Eu irei – Billy acenou com a
cabeça, e Bart exclamou:
_ Tá certo, isso decide! Os
demais, por favor, cooperem com o Sig!
_ Espere, eu vou também!
_ Hein? – Bart voltou-se para
Margie, que não estava olhando para ele com o ar costumeiro de quem não queria
ser deixada para trás; havia algo mais sério – Mas você não precisa...
E então, Bart lembrou-se. Era do
corpo da mãe dela que estavam falando ali, afinal. Ela tinha tanto direito
quanto qualquer um a ir, e uma motivação pessoal.
_ Ah, tá certo. Desculpa, Margie.
Vem com a gente, então. Beleza, gente... Estou contando com todos vocês! Da
próxima vez que eu vir esse tal de Shakhan, ele é um cara morto!
BUT RUN THROUGH THE HEART