domingo, 29 de novembro de 2015

Capítulo Vinte e Nove Ponto Um

(...)

_ Billy – o rapaz ouviu em seu comunicador, enquanto o pai dava instruções – Se combinarmos os nossos Gears, podemos atravessar aquela barreira com nosso poder unido. Eu vou pegar o seu ombro emprestado por um momento, então começa a fazer mira!
_ Vamos acabar com isso de uma vez por todas, hein Stein? – Jessie seguiu, agora se dirigindo ao Alkanshel – Mas, eu quero que saiba... Você não vai ver Racquel quando morrer...! Isso, porque o seu destino vai ser o inferno!
Outra vez, Billy admirou-se com o pai. O pai não parecia acreditar em coisa alguma, e agora estava falando em céu e inferno...! Mas Citan estava mais preocupado com outro aspecto que lhe chamara a atenção.
_ Eu sabia! Jesiah está planejando usa-lo! Ele tem que ser detido! Billy, pode me ouvir?! Billy...! Não adianta... Não há resposta!!
_ Billy, você sabe agora, não sabe?
A voz do pai era serena, e o rapaz finalmente percebeu que era assim que ele se lembrava de Jessie. Ao seu lado, no melhor ou no pior, como um verdadeiro pai deveria fazer. Ainda que ele cometesse um engano terrível, Jessie sempre estaria lá por ele. Porque era seu pai.
_ Os ensinamentos de Stein eram um engano. Aquela fé fabricada era só um sistema mundial pra compensar pessoas com almas frágeis. Mas, fé e Deus não são coisas que sejam dadas a você pelos outros, certo? São coisas que você tem que descobrir dentro de si, e por si mesmo. Coisas que não podem ser postas em palavras, coisas que não podem ser expressas... Não é a respeito disso que se fala quando se fala em Deus? “Não questiona a teu Deus, pois teu Deus não responde’”.
Uma lágrima deixou os olhos de Billy e ele suspirou profundamente, sentindo a alma mais leve do que julgaria possível um minuto atrás. Seu pai, um homem de fé...?
_ A razão pela qual ensinei você a usar uma pistola quando criança foi pra salvar pessoas – Jessie seguiu, sempre com sua voz tranqüila e baixa – Você diz que armas são só ferramentas para matar pessoas. Mas está errado. ‘Armas’ não matam pessoas. ‘Pessoas’ matam pessoas. Você por acaso já olhou as expressões daqueles Ceifadores que você destruiu?
“É um processo excruciante ser transformado num Ceifador. Pra acalmar sua dor tortuosa, eles procuram sangue humano, e atacam pessoas a fim de consegui-lo. Mas, isso não elimina a verdadeira dor em seus corações. Só há uma forma de ser salvo da dor. Através do extermínio. Por acaso, todos aqueles Ceifadores cuja angústia foi encerrada por você não tinham olhares de paz em seus rostos?”
“Sua pistola salvou aquelas pessoas que foram tornadas em Ceifadores. Não é algo que qualquer um possa fazer. A fé que capacitou você a conseguir tal coisa não foi engano... Deus existe em seu interior!”
_ Pai...
Ele podia sentir agora. Estava lá, onde sempre tinha estado. Um pouco ferida pelos eventos recentes, e pelo abuso de sua confiança, mas sua fé fora renovada. E fortalecida pela força de seu pai. Jessie, não Stone. Ele era Billy Lee Black, filho de Jesiah e Racquel. Um Etone e um homem de fé. Não havia motivo para se envergonhar disso, ou se arrepender.
_ Muito bem, agora vai Billy! Vamos!
Renmazuo voltou-se, enquanto um Gear branco menor, o Buntline de Jessie, saltou diante dele e dobrou-se inteiro, tornando-se numa arma de disparo sobre seu ombro. Com um tiro certeiro, ele atingiu Alkanshel e um estrondo luminoso fez até mesmo a Yggdrasil estremecer sob eles. Na ponte de comando, os oficiais de Bart exultaram:
_ A barreira... A barreira foi eliminada!
_ Tarde demais... – murmurou Citan desconsolado. E Stone não podia acreditar que Jesiah, mais uma vez, ficara em seu caminho.
_ Gaaaahh...! M-Maldito Jesiah...!
_ Preocupe-se comigo, senhor – Billy retrucou pelos comunicadores, o Renmazuo avançando de punhos em riste, disparando. E desta vez, Alkanshel foi atingido, e Bart seguiu atrás com animação.
_ É isso aí, aquela barreira já era! Agora, outra vez... Sorriso Selvagem!
Novamente o Brigandier cruzou seus pulsos diante dos olhos, e os efeitos foram imediatos, uma cegueira súbita cobrindo os visores do Gear de Solaris, além de aumentar sua lentidão. Stone rosnou por trás dos comandos:
_ Malditos... Eu não preciso enxergar para acabar com todos... Limitação de Massa!
Uma onda de energia, um pulso intenso irradiou-se da esfera do Alkanshel, fazendo os três Gears recuarem ao mesmo tempo. O de Rico foi o primeiro a se reerguer, e o Campeão bateu em seus instrumentos, aborrecido.
_ Droga... Aquela onda de energia deve ter bagunçado com meus instrumentos... Perda de cinqüenta por cento da capacidade...?
_ É uma técnica dos Gears de grande porte de Solaris – Citan esclareceu pelos comunicadores de todos – Um pulso intenso de energia que desgasta os sistemas de bordo e a estrutura do exoesqueleto de Gears menores. Vocês precisam derrota-lo antes que tenha chance de recarregar o disparador; talvez seus Gears não sobrevivam a outra onda deste tipo.
_ Fale pelos outros – rosnou Rico, deslizando adiante sobre as esteiras do Stier – Broca de Guerra!
Stier investiu contra o Alkanshel, o primeiro soco seguido por um mergulho com sua broca. E recuou antes que o Gear maior pudesse contra-atacar.
_ Anda Billy, faz a sua parte – ordenou Bart – Rico te mostrou onde atirar; uma boa salva de tiros ali em cima pode fazer o serviço! Eu mantenho ele ocupado!
Brigandier deslizou adiante e bateu seus chicotes, fazendo Alkanshel recuar com o ataque. Renmazuo ergueu-se e correu para direita, abrindo fogo com seus disparadores de pulso.
Stone sentiu a estrutura do Alkanshel vacilar diante das balas de pólvora e ether de Billy, e amaldiçoou em voz alta. Outra vez, Jesiah, e seus filhos!
_ Não desta vez... Não desta vez!!
O Gear imenso era lento, e pelos efeitos do Sorriso Selvagem de Bart, estava praticamente cego. Mas ainda tinha seus recursos.
_ Selo!
Os emissores da máquina de ether do Alkanshel não precisavam de confirmação visual de alvo, podendo atingir um inimigo próximo automaticamente, como Bart descobriu ao ser duramente derrubado sobre o convés. E Rico, conhecedor de Gears, percebeu que o golpe podia ter sido demais nas atuais condições do Brigandier.
_ Bart! Bart, como está aí?
Apenas estática veio pelo comunicador a princípio; então, o rosto do pirata apareceu com cabelo sobre o rosto e parecendo surrado, mas bem.
_ J-já estive... bem melhor... ugh!
_ Com as defesas e o Gear enfraquecidos por aquela Limitação de Massa, você tem sorte de ainda estar respirando – Rico grunhiu – Recue. Eu dou apoio ao garoto.
_ Não... Espere aí – Bart olhou na direção da proa do convés, onde Billy estava disparando com as pistolas de Renmazuo. Alkanshel tornou a atacar, e Renmazuo recuou – Os efeitos do Sorriso Selvagem... vão acabar logo. E aquela coisa vai recarregar a Limitação de Massa pouco depois. Temos que pegar ele agora... e eu tenho um plano.
Renmazuo tombou para trás, rolando e ganhando distância, enquanto Alkanshel tornou a utilizar o Selo. Um impacto pesado tombou o Gear para trás, e Stone disse entre dentes:
_ Meus sistemas estão se normalizando... Billy, arrependa-se agora! O castigo divino está sobre ti!
_ Você deve ter... mais razões para teme-lo do que eu! – Billy também estava em situação difícil, como Bart. Todos os seus instrumentos estavam indicando condição crítica, e Renmazuo não se recuperaria dos danos antes da visão de Stone ser refeita. Havia um ponto vulnerável onde Rico atacara com sua broca, mas não conseguiria alcançar aquela altura sozinho em suas condições. Podia atirar de onde estava, claro; no entanto, se pudesse atingir aquela abertura com sua ‘Pistola de Impacto’, no ângulo certo...!
_ Anda Billy... – estática em seus comunicadores - ... daí! Ele não vai ficar... sabia?
_ Bart?
Stier deslizou para frente, encontrando Alkanshel com seu Grande Slam e fazendo o Gear de Stone recuar pelo convés outra vez, batendo do lado direito. E o bispo finalmente localizou por o atacante, seus visores clareando sensivelmente.
_ Hah... Outro pecador! É a hora do seu julgamento...
Alkanshel ergueu seu punho esquerdo, agora disposto a atingir Stier de cima para baixo e perfurar o convés da Yggdrasil ou esmagar o oponente contra ele, o que fosse mais simples. Mas não conseguiu atacar.
_ O quê...?
_ Vai, Billy! Rico...!
Brigandier deslizara pelo lado oposto, aproveitando o momento em que Stier atacara. Bart usara seus chicotes para prender o punho do Alkanshel, e estava usando cada gota de energia que ainda tinha para isso. Era um risco que só lhes daria chance para atacar uma vez, mas dada a habilidade de Billy, deveria ser suficiente.
Renmazuo correu para adiante, e Stier firmou-se para servir de trampolim. Com o devido apoio, o Gear de Billy saltou e subiu, alcançando o nível da abertura causada pela Broca de Guerra de Stier.
_ Era isso! Pistola de Impacto!
Renmazuo golpeou pesadamente com seus dois punhos o ponto já danificado. E sacou suas pistolas, disparando repetidamente na abertura. E soltou-se, caindo para trás enquanto tornava a disparar com seus pulsos. E uma explosão maciça da parte superior do Alkanshel acompanhou o grito final do Bispo Stone, enquanto o imenso Gear caía ao mar e enquanto o Gear de Billy tombava no convés.
_ É isso! – a voz de Bart exultou pelos comunicadores, tanto quanto os danos permitiam – Billy, bom...! Muito bem!
Ele sorriu com dificuldade. Seu Gear tinha sido muito surrado, teria muito que explicar às crianças quando voltasse ao orfanato... Mas primeiro, lembrou-se, tinha outra pessoa a ver.
_ ... Meu pai. Vocês o viram?
_ Billy, eu sinto muito – a voz de Citan veio pelos comunicadores, e todos os que estavam festejando silenciaram, sem entender por que o doutor parecia entristecido – O Buntline de Jesiah... Aquela é uma pistola que utiliza seu piloto como munição. Para romper a barreira de energia negativa de Stone, ele...
_ O q-quê?! E-então... Meu pai está...? Ah, meu Deus...!

Pouco mais tarde, todos os Gears tinham sido removidos para reparos, enquanto a Yggdrasil rumava para a Thames, para cumprir a promessa feita ao Capitão. Bart, Citan, Rico e também Billy e Primera estavam sobre o convés, contemplando o mar. No fundo do oceano jaziam os restos do Alkanshel, de Stone e seu ódio, mas o preço que fora pago por tal vitória era alto demais.
_ Papai...
_ Billy, eu realmente sinto muito – Citan tocou o ombro do rapaz – Eu não deveria ter criado tal coisa...
_ Não, não é culpa sua...
Billy sacou suas pistolas e disparou para o alto três vezes, com a irmã menor olhando para ele. O rapaz sorriu tristemente para ela, e guardou as armas.
_ Essa é a melhor maneira de me despedir do pai.
_ Você está certo... Obrigado, filho.
Desnecessário dizer, todos se sobressaltaram, voltando o olhar para a popa. Jessie vinha se aproximando deles tranqüila e silenciosamente, com um sorriso no rosto. Primera foi correndo abraçar as pernas do pai, enquanto Billy se refazia.
_ P-papai!
_ Velho amigo! – Citan sorriu, agradavelmente surpreso – Você está bem?
_ É melhor acreditar! – Jessie piscou, sacando a carabina e apontando-a para o lado – Eu não ia deixar aquela sucata idiota quieta! Melhorei ela!... Ai-ai-ai-ai-aiaiai... Mas nunca mais quero fazer aquilo de novo, viu...
_ Mas, seja como for... – Citan ponderou – Por falar em inferno... Estou surpreso em saber que uma pessoa sem religião como você acreditaria em vida após a morte.
_ Ah, então você tava ouvindo? – Jessie comentou distraidamente, com a carabina repousando no ombro direito e a mão esquerda na cabeça de Primera – Aquilo era uma praga. Não é um fim bem adequado pra ele?
_ É – Citan sorriu – Isso definitivamente é o seu estilo.
_ Pa... pai...
Todas as atenções se voltaram para Primera, que balbuciara com dificuldade. E o espanto de Billy foi o maior de todos.
_ P, Prim?! – ele veio correndo até a irmã – Prim, o que você acabou de dizer? Hein Prim?
_ Pa... pai – ela sorriu de volta para o irmão, e Jessie gargalhou:
_ Haha, ouviu essa? O problema de Primera parece ter sido resolvido!
Os demais estavam sorrindo, e Billy ajoelhou-se diante da irmã, maravilhado.
_ Hah...! Prim falou! Prim acabou de falar! Ei, Prim... Agora fale o meu nome. Diga ‘Billy’!

_ E quanto ao ‘Ethos’? – Jessie perguntou depois, com todos reunidos na ponte de comando da Yggdrasil – Eles se devastaram completamente! Aquilo ali só vai de mal a pior!
_ Não acha que já é hora de contar a verdade ao seu filho, velho amigo? Você não ficava só andando por aí, bebendo e arrumando brigas, ficava? Tenho certeza de que ele quer saber o que andou fazendo... Não é mesmo, Billy?
_ Sim, certamente ia me fazer sentir muito melhor – ele deu um sorriso contrariado – Agora eu sei que meu pai estava preocupado comigo o tempo todo, mas ainda não coloquei meus sentimentos em ordem...
_ O que quer dizer? – perguntou Jessie, e Billy deu-lhe as costas, cruzando os braços e com ar de aborrecimento:
_ Bem, estou feliz que Prim consiga falar agora, mas ela só chama pelo pai dela... Mas fui eu quem tem tomado conta dela esse tempo todo...! O que é que há com ela...?
_ Acalme-se, Billy – Citan reprimiu o riso – Eu tenho certeza de que ela apenas está sendo tímida. Em breve ela começará a chamar por você. Quanto a isso – acrescentou com ar de resignação – minha própria filha nem sequer chama o nome do pai dela!
_ Então, velho amigo – Citan voltou-se para Jessie com curiosidade – Por que esteve trabalhando sozinho este tempo todo?
_ Não deu pra evitar... – Jessie baixou os olhos, enquanto as atenções se voltavam para ele – De qualquer forma, eu provavelmente vou precisar da sua ajuda daqui por diante... Tá, eu te conto mais. Vamos pra a sala de armas... arrumar algo pra beber.
“Quando eu estava em Solaris – Jessie começou, quando todos os outros já estavam em torno de uma mesa, e ele já tinha um copo na mão – descobri sobre o plano secreto. Era o Plano ‘Malakh’ (M). E foi feito sob o comando de Krelian. A fim de seguir com o plano, muitos Cordeiros foram reunidos pelo ‘Ethos’ pra se tornarem cobaias. Ou, deveria dizer, pra se tornarem Ceifadores, ou Wels...”
“Uma vez que eu desgostava dos métodos de Solaris, decidi investigar mais adiante. Descobri que o cientista central pra o plano M mudou os verdadeiros fatos sobre ele pra um Gear de teste. Aí, ele fez esse Gear escapar com a filha dele, pra que a verdade não fosse descoberta... e essa, receio, foi a última informação que fui capaz de obter...”
_ Por causa do que descobri – Jessie apontou a carabina distraidamente, sem notar que apontara para Maison, atrás do balcão, que se assustou – eu desci pro mundo da superfície. E aqui foi onde me escondi com minha esposa, Racquel, e meu filho Billy. Estive procurando por aquele Gear e a garota desde então. Por fim, descobri que a filha do cientista e o Gear podem estar em Shevat. Tudo muito bem, exceto que agora eu não sei como raios entrar lá, ou sequer contatar o lugar. Bem – ele baixou a cabeça, com um sorriso resignado – Shevat é protegida por uma barreira tão forte que mesmo Solaris não pode fazer coisa alguma a respeito. Então, acho que se pode dizer que não dá pra evitar... É só a minha sorte!
_ Por acaso o nome dessa menina não seria Maria...?
Todos se voltaram. Fei, Elly e outra pessoa tinham acabado de entrar na sala de armas. E Billy o reconheceu como um dos sobreviventes ao massacre no ‘Ethos’, resgatado da enfermaria, e perguntou:
_ Vocês estão bem? Não deveriam descansar mais um pouco...?
_ Sim, posso ficar de pé e até falar agora... graças a vocês – o desconhecido curvou a cabeça em agradecimento – Vou lhes contar o que puder. A verdade é que eu era um agente de Shevat infiltrado no ‘Ethos’ e fui pego durante a purga. Teria morrido sem poder colocar a terra natal a par do que acontecia se não fosse por sua ajuda.
_ O nome dela é Maria, hein...? – Jessie cortou, indo direto ao assunto – Hmm... Se me lembro direito, o nome do pai dela era Nikolai?
_ Isso eu não saberia dizer – lamentou o agente de Shevat – Mas tenho ouvido rumores sobre uma menina e um Gear.
_ Hm, devem ser eles – Jessie acenou com a cabeça – Assim, aquele Gear enorme deve estar em Shevat! E então... como chegamos a esta Shevat? Tem um jeito de contatar o lugar?
_ Infelizmente, desde que fui pego cativo eu também não tenho como contatá-los... mas pode haver uma forma...! – ele pareceu relembrar – Originalmente, Shevat estava situada no topo da Torre de Babel. Dizem que há uma instalação de comunicação para contatar a terra natal de Shevat no alto da torre. Se ao menos ainda existir...
_ Hmm – ponderou Citan – Há uma boa possibilidade de a instalação ter sido destruída... Principalmente considerando o fato de que a torre foi selada pelo ‘Ethos’.
_ Tá sendo pessimista de novo – queixou-se Jessie com ar de reprovação.
_ Só estou sendo realista – replicou Citan, e Billy deu de ombros.
_ Eu acho que não temos escolha, a não ser fazer uma tentativa. Seja como for, enquanto o portão existir, não podemos fugir da sombra de Solaris.
_ O ‘plano secreto’ deles também me perturba... – concordou Citan – O verdadeiro segredo é que estejam usando humanos reunidos da terra.
_ Mas eu não entendo direito este plano secreto, ou o envolvimento do ‘Ethos’, e daí por diante – comentou Fei – O que Solaris pensa que nós, humanos da superfície, somos?!
E então, lembrou-se de Elly e desculpou-se.
_ Ah, desculpe... Eu esqueci totalmente de que é a sua terra.
_ O que minha terra está fazendo não tem nada a ver comigo – ela replicou, acenando negativamente – Eu mesma achava que algo estava errado lá, e foi por isso que vim para cá. Então, não se preocupe comigo.
_ Certo... Bem, não temos nada a perder, então vamos tentar ir até lá – decidiu Fei – Precisamos descobrir a verdade quanto aos documentos descobertos no quartel-general do ‘Ethos’, e quanto ao que o pai do Billy disse. E eu também preciso ir a Shevat por razões pessoais, seja como for.
  

WE CAN RUN TO THE END OF THE WORLD

domingo, 22 de novembro de 2015

Capítulo Vinte e Nove

Capítulo 29: Redenção e Punição



Ao voltar para bordo, Citan levou Elly imediatamente à enfermaria para que se recuperasse da provação sofrida em Zeboim. Para surpresa de todos ao chegarem lá, não havia qualquer sinal de Fei.
_ Podem imaginar o meu espanto – disse a enfermeira – Peço que me desculpem, mas não sei para onde ele foi. Sem dúvida deve estar em algum lugar a bordo, mas...
_ Pode tomar conta dela por nós? – Citan deixou Elly sobre um dos leitos – Vamos procurar por Fei. Ele... não pode estar longe.
Foram encontra-lo após alguma procura junto a Weltall, parecendo um tanto distraído, olhando para o Gear.
_ Fei?
O rapaz voltou-se, ainda parecendo alheio. Havia reconhecimento em seus olhos, e algo mais que nem Citan nem Billy saberiam definir.
_ Uh, Doc... E...?
_ Meu nome é Billy – Billy curvou um pouco a cabeça, lembrando-se de que Fei ainda não o conhecia – Então, já está se sentindo melhor, Fei?
_ É... Provavelmente...
_ O que está fazendo andando de Gear, quando acabou de se recuperar? – Citan indagou, olhando para os exaustores ainda ativos de Weltall, e Fei baixou a cabeça.
_ Eu mesmo não sei o que estou fazendo aqui... Minha mente ainda não está clara.
E sacudiu a cabeça, como se pudesse organizar seus pensamentos assim. E Citan outra vez ponderava a respeito, quando um sinal de alarme soou. E veio o aviso do comunicador interno para alertar:
_ Alkanshel localizado logo adiante!! Preparar Gears para lançamento!!
Fei parecia desnorteado, enquanto Citan e Billy se entreolharam. Na ponte de comando, o imenso Gear de Stone surgia nas telas principais, flutuando sobre eles mediante os olhares preocupados da tripulação. Mas Sigurd os tranqüilizou quanto à situação imediata com sua avaliação:
_ Parece que estão nos observando.
De volta ao hangar, Fei foi detido por Citan e amparado, quando fez menção de subir a bordo de Weltall.
_ O que pensa que está fazendo, Fei?
_ Eu... preciso ir...!!
_ Você não está em condições de participar. Deixe que tomemos conta disto!
_ Parece que é hora de acertar as contas – murmurou Billy com ar pensativo e sombrio – Mas, Fei deveria descansar.
_ Sim, eu o levarei até a enfermaria – concordou Citan – Billy, por favor cuide do resto.
Lembrando-se do poder de Bart em reduzir a visibilidade de um oponente, e contando com a força do Gear de Rico, Billy formou seu grupo para a próxima batalha enquanto Elly e Fei repousavam na enfermaria, e Citan em breve se uniria ao grupo, fazendo sua avaliação da cabine de comando. Mas se possível, o jovem Etone pretendia encerrar aquela disputa por si mesmo.
Lá em cima, sobre a Yggdrasil, Stone estava impaciente. Finalmente estava em sua verdadeira forma, sua força ampliada além do alcance de um humano comum; que sua pele parecesse ter sido esfolada de tão vermelha, e seus dentes salientes lembrassem uma caveira, tudo era irrelevante. Ele fora o primeiro a experimentar as melhorias de Krelian, e agora ansiava por uma oportunidade de exercitar sua nova força e vingar-se, de uma vez só.
_ Observar... Que forma mais cheia de rodeios de agir...! Basta cuidar disto de uma vez e estará acabado... Aqueles que se tornam inimigos dos sagrados Gazel, eu ensinarei a todos. Arrependam-se agora!
_ Você... quer o poder?
Uma onda impressionante de força fez todos os comunicadores de Stone oscilarem por um momento, e ele inadvertidamente hesitou diante daquela energia.
_ Q... Quem é você?
Numa velocidade vertiginosa, um objeto aproximou-se por cima do Alkanshel, veloz demais para que o Bispo Stone tivesse qualquer chance de reação, principalmente levando em conta a lentidão inerente a seu Gear.
Subitamente, ele viu-se frente a frente com um majestoso Gear de bronze, de braços cruzados e emanando uma estranha e agressiva aura vermelha. E um mascarado respondeu em seu comunicador:
_ Sou Grahf, aquele que caça o poder. Desejas o poder?
_ Poder? – Stone recuperou algo de sua arrogância; estranho ou não, aquilo era só um homem – Hmph, há poder suficiente, aqui! Eu recebi este corpo de Krelian!
_ Todo este poder é falso – Grahf replicou com voz indiferente – Acha que pode vencer com ele?
_ O que quer dizer com ‘poder falso’?
_ Um falso corpo... Um falso despertar. É tudo inútil! Eu darei a você o poder!
Mais energia. E a mão direita do Gear de bronze ergueu-se, emanando sua aura agressiva em toda sua intensidade.
_ Meu punho é o sopro divino! – recitou Grahf – Desabrocha, ó semente caída, e revela teus poderes ocultos!! Lanço sobre ti o poder da gloriosa ‘Mãe da Destruição’!
O punho desfez-se em mão aberta, e a energia ali contida banhou Alkanshel, enquanto Stone grunhia de dor. E então, o Gear de Solaris desceu sobre a Yggdrasil.
Renmazuo, Brigandier e Stier esperavam por ele, e Alkanshel se aproximou usando seu ataque ‘Selo’, um poder de ether de impacto, atingindo o Gear de Billy pesadamente.
Bart ativou seus turbos e então lançou o ‘Sorriso Selvagem’ de Brigandier. No entanto, havia uma aura vermelha ao redor do Alkanshel, e ela cintilou ao receber o ataque.
Stier investiu, golpeando com sua broca e então as metralhadoras. Novamente a aura vermelha cintilou, e Alkanshel permaneceu ileso, revidando com um golpe pesado de seu punho.
_ Hmph... – Rico grunhiu, enquanto o Stier compensava o impulso contrário – Bem resistente, ao que parece. Mas vamos ver quanto tempo vai agüentar...
_ Espera aí, Rico! – Bart alertou – Tem alguma coisa errada; ele não devia ter te acertado, não depois do Sorriso Selvagem. Isso devia nos dar pelo menos um minuto sem ser vistos!
_ O que quer dizer?
_ O jovem tem razão – Citan avisou pelos comunicadores deles, analisando a situação de onde estava – Há alguma espécie de barreira. Um tipo de emoção negativa... Ódio, transformado em habilidade ether, formando uma barreira... Se pudermos de algum modo mudar nossa poderosa força de vontade em ether também e lançar isso contra ele...!
_ Heh – fez Stone, enquanto Alkanshel flutuava impávido sobre o convés da Yggdrasil – Filho de Jesiah, está sofrendo?
Renmazuo levantou-se, e Billy encarou o inimigo. Era contra ele. Stone podia estar cumprindo ordens de Solaris ao atacar a Yggdrasil, mas sua principal motivação estava voltada para ele! O ódio que dava forças à sua barreira tinha a ele como alvo... porque ele era o filho de Jessie.
_ Quando eu o aceitei há quatro anos, isso foi prova da minha velha amizade com seu pai – Stone murmurou, parecendo perder-se em lembranças – Naquela amizade manchada por ódio com Jesiah, nós competimos pelo comando da Gebler! Jesiah... Como um animal, você roubou a Racquel que eu amava, jogou fora o comando da Gebler que eu tanto queria, e então desapareceu de Solaris!
“Quatro anos atrás... – ele lembrou-se de Racquel, sentada à mesa com ar entristecido de espera – Depois de procurar até os confins da terra, nenhum sinal dele podia ser encontrado”.
De repente, um Wels entrou por uma das portas, e Racquel viu um segundo invadir pela janela. Não dera dois passos na direção da porta dos fundos quando um terceiro Wels entrou por ela.
_ Racquel, suja por ele... E as lembranças daquela mácula... você e sua irmã... Através da sabedoria de Krelian, usando os Wels, eu salvei Racquel da angústia...
E Racquel tombou diante das pistolas. O mesmo som que Billy lembrava-se tão bem, um disparo após o outro, e até mesmo os cartuchos vazios caindo ao chão. Mas não tinham sido os Wels a disparar...
_ Seu filho de uma...! – Renmazuo ergueu os disparadores em seus pulsos – Você usou os Wels... contra minha mãe...!
_ Sim, Billy, deixe-me te contar algo de bom – Stone riu por pura maldade – Aqueles Ceifadores que você estava purgando, na verdade, eram todos pessoas. Eles foram escolhidos pelo ‘Ethos’ e convertidos por Krelian! Você esteve assassinando pessoas! Hahaha... Um filho maldito de um pai maldito! Hahahahahahahahahahaha!
Renmazuo baixou as mãos. Billy, no fundo, temia algo assim. Cada um dos inúmeros Wels que abatera em nome do sagrado serviço... Desde que descobrira a verdade sobre o ‘Ethos’, ele estivera esperando por tal tipo de informação, e sentia um grande abismo formando-se ao seu redor. Então, era um assassino...?
_ Hah, confesse-se a mim! – rugiu Stone – Pague por seus pecados!
_ Não.
Uma voz interrompeu Stone, e parecia que o próprio vento reduzira seu sopro para ouvi-la.
_ Não há nada pelo qual você precise se arrepender, Billy.
O rapaz olhou em volta. Era a primeira vez em muito tempo, que realmente sentia júbilo em ouvir aquela voz. Uma voz antiga, poderosa, de alguém que gostava do melhor que a vida podia oferecer. Mas que também era um homem extremamente habilidoso no que fazia, o homem que falou a Stone:
_ Diz que você e Racquel estavam apaixonados? Você sempre foi um idiota narcisista autopiedoso!!
_ !!! Esta voz...!! – rosnou Stone, e a barreira de Alkanshel ficou mais evidente enquanto seu ódio cresceu. Um som de jatos se fez ouvir, e Jessie aproximou-se velozmente, avisando:
_ Eu pego esse aí!! Use isso, Billy! Se usar, pode rasgar a barreira!!!
Citan também estava observando, e estremeceu ao ver o Gear que Jessie estava pilotando.
_ A... Aquilo é um Buntline... Um Gear pistola de ether onde o piloto cavalga diretamente a bala. Se usarmos isso, podemos romper o poder negativo do ódio de Stone!... N-no entanto...

domingo, 15 de novembro de 2015

Capítulo Vinte e Oito Ponto Dois

(...)

Os vidros partiram-se por toda a passarela enquanto Id desceu ao nível deles, e ficou parado com ar de desafio entre eles e o grupo de Stone. Citan reconheceu algo no desconhecido, algo familiar, mas preferia estar errado daquela vez. E resolveu que sendo o mais velho e experiente, devia ser o primeiro a ir.
E investiu com seu Reken. Diante dos olhos admirados de Billy e Elly, e diante da surpresa do próprio Citan, o desconhecido calmamente evitou golpe após golpe, sem qualquer esforço aparente. Punho à esquerda, direita, esquerda novamente, giro... Id os evitou a todos.
Citan recuou e tentou completar a técnica, ao menos atingindo Id com o chute. O desconhecido agarrou seu pé com a mão esquerda, girou-o sobre a própria cabeça e lançou-o de volta na direção dos amigos, como se não tivesse peso.
Enquanto Citan atingia a parede atrás de si pesadamente, Billy ergueu suas pistolas. Talvez Id pudesse evitar artes marciais, mas teria a velocidade para escapar de tiros? Ainda mais do seu Quebra Nozes?
Tiro após tiro saiu partiu das duas pistolas de Billy numa seqüência cadenciada. E Id, numa demonstração incrível de agilidade e técnica, desviou-se de alguns dos disparos e desviou outros com braços, pulsos, pernas e joelhos, parecendo ser inacreditavelmente mais veloz até mesmo do que as balas.
_ Esta é a nossa chance – murmurou Stone entre dentes – De volta a Krelian...
_ Bispo Stone, espere! – Billy viu os solarianos escaparem pela comporta e fez menção de persegui-los. Mas não dera dois passos adiante quando Id subitamente parou bem diante dele, retrucando com o mesmo ar frio e insano:
_ Está lutando comigo. Vou faze-lo prestar mais atenção.
Num movimento rápido, ele moveu os dois braços para trás e então para adiante, formando um globo escuro de chi que cresceu até tomar toda a passarela e então explodiu, lançando a todos com violência para trás. Elly, que não atacara ainda e se mantivera em guarda, resistiu um pouco melhor, enquanto seus dois companheiros jaziam no solo.
Ela olhou além de Id. O outro não parecia fazer a menor conta disto, mas Stone e alguns de seus seguidores já haviam desaparecido. Alguns dos outros, no entanto, estavam tombados no beiral da porta; decerto, abatidos pelos disparos de Billy que Id apenas evitara. E aquilo aumentou sua apreensão de que os outros escapassem.
_ Você não disse que queria aquilo de volta? – Elly perguntou, mantendo-se a custo de pé – Eles a estão levando! Não percebeu?
_ Posso ir atrás deles quando quiser – Id retrucou simplesmente – Mas nunca deixo uma luta por terminar. E, era tudo o que queria dizer?
Não havia muito o que fazer, Elly percebeu. Se o outro era capaz de evitar até mesmo as balas de Billy, ela não seria de melhor sorte. Não com ataques físicos.
Elly ergueu seu bastão e chamou:
_ Lança de Terra!
Não sabia o quanto o outro podia ser vulnerável a ataques ether, mas se pudesse abalar a área específica da passarela onde ele estava, talvez pudesse lança-lo lá embaixo. E foi a primeira vez em que Id pareceu surpreso durante a batalha, durante o breve instante antes de desaparecer no ataque de terra de Elly.
Havia um buraco vazado no piso da passarela, feito de forma a danificar mas não eliminar o acesso, mostrando o  controle de Elly sobre sua técnica. Id estava pairando sobre o rombo como se o piso ainda estivesse lá, batendo levemente sobre seus ombros e braços como se estivesse empoeirado, sem parecer notar nada à sua volta por um breve instante. Então voltou-se para Elly, sinalizando que não.
_ Isso... não vale.
E deslizou depressa na direção dela, a ponto da moça não poder dizer se ele flutuara ou correra até ela. E tinha seu punho direito erguido, como concentrando energia, que descarregou sobre ela num golpe explosivo, arremessando Elly inconsciente na direção da parede. E Citan reconheceu aquela técnica.
_ I-isso parece-se com... o Raijin!
Id voltou-se para Citan com o mesmo olhar vazio de antes, sem dizer palavra. Billy também ergueu-se com dificuldades, e lançou sobre todos sua Luz Sagrada, fazendo com que ele e Citan pudessem ficar de pé novamente. Mas Elly continuou caída onde estava, abalada pelo poder do golpe.
_ V-você é forte... – ofegou Billy – Hã?
Um segundo Gear, azul e prateado, desceu pelo lado oposto da passarela e agarrou Id com firmeza. Surpreso, o lutador olhou para a máquina, murmurando apenas:
_ !! ... Você...? ...
_ Eu o peguei! – bradou o piloto do Gear recém-chegado, com uma voz que Citan reconheceu – Depressa, vão atrás deles!!
_ Esta voz... Sábio!
Citan não deixou de reparar, também, que o Gear do Sábio lembrava muito Weltall: a mesma estrutura, mesmo modelo, apenas parecendo ter prata e verde onde Weltall era negro e amarelo. E, por falar nisso...
_ Vão!! Todos, depressa!
Era melhor que guardasse suas conjeturas para mais tarde, pensou, antes que Stone escapasse.
Billy tomou a frente, enquanto Citan carregava Elly. E Id deu um sorriso contrafeito ao vê-los fugir, encarando o Gear do Sábio.
_ Hmph, um pouco antecipado, não? – ele estava intrigado com a chegada prematura do homem mais velho, mas não era preciso muito raciocínio para que deduzisse o que acontecera. Não entre eles – Entendo, foi aquela mulher... Tudo bem. Você vai servir como meu brinquedo... por hoje.
A energia chi de Id brotou, vermelha e agressiva, e ele se livrou da mão do Gear prateado com pouco esforço, para apreensão do Sábio.
_ Hã? ... Oh, não...
_ Hah ha hyah ha ha ha ...
A aura agressiva de Id pareceu repelir o Gear prateado do Sábio, enquanto tudo à volta deles estremecia, lentamente a princípio, e cada vez mais.
Um andar acima, acabando de selar uma porta atrás de si, Billy e Citan subitamente sentiram os impactos poderosos mesmo onde estavam, e Billy suspirou:
_ Uau... Bem na hora. Aquele homem e o Sábio... Estão realmente arrasando com tudo. O poder ether consegue chegar até aqui...!
Seguiram adiante, passando pelo último elevador e finalmente chegando ao exterior. Mas a nave esférica negra estava se afastando, além do alcance das armas da Yggdrasil.
_ Então, chegamos muito tarde... – murmurou Citan.
_ Citan, afinal, o que acontece agora que Krelian tem a criança? – quis saber Billy – O que é uma nanomáquina, afinal?
_ Nanomáquinas são robôs que são menores do que células humanas – explicou Citan, ainda com semblante preocupado – São usadas para curar doenças ou feridas em Solaris... Ela pode ser uma colônia de nanomáquinas feita por uma antiga, mas avançada tecnologia.
_ ... Mesmo que seja apenas para o povo de Solaris – Billy ainda não entendia o problema – o que há de errado em fazer as pessoas felizes?
_ Estou preocupado com o que o Bispo Stone mencionou – Citan replicou, ainda olhando para o céu com ar apreensivo – Ele disse que precisava dela para ‘libertar a humanidade de seu jugo’. Talvez alguma informação antiga sobre reconstrução humana esteja escondida no corpo dela...
“Meio humanos, tais como Rico e Hammer, nasceram como resultado de brincadeiras com o DNA.... Isso foi feito pela antiga Solaris, na esperança de que traria a restauração da humanidade. Se Krelian está pensando em fazer o mesmo com nanotecnologia melhorada... Isso seria assustador.”
  


WE CAN RUN TO THE END OF THE WORLD

domingo, 8 de novembro de 2015

Capítulo Vinte e Oito Ponto Um

(...)


Uma delas, uma oficial de uniforme verde e cabelos de prata com pequenos pontos esverdeados em seu rosto, meramente deu de ombros enquanto as duas penetravam na sala e, sem a menor cerimônia, ficaram entre o trio e a menina, que foi retirada por Stone e os outros soldados. Elly as reconheceu como dois membros dos Elementos de Jugend, e Citan reconheceu aqueles uniformes, mas Billy teria mantido Stone sob mira se a outra, uma garota de cabelos e roupas cor de rosa e ar infantil não tivesse entrado em seu campo de visão, enquanto o bispo dizia:
_ Tolone! Seraphita! Consigam-me tanto tempo quanto possível!
_ Já sabemos, já sabemos! – Tolone, dos cabelos de prata, resmungou – Pare de ficar nos dando ordens!
_ Ei, Tolone – Seraphita sacudiu a cabeça numa forma muito infantil, parecendo aflita – Vamos andar logo com isso e terminar o serviço pra podermos ir embora daqui! Eu não gosto de lugares escuros!
Os modos da outra, agindo como uma garotinha, fizeram Citan e Billy inadvertidamente baixarem a guarda. Havia uma pessoa ‘assim’ nos Elementos? Apenas Elly manteve-se em guarda, embora parecesse um pouco envergonhada. E Tolone concordou com a colega.
_ Tá, tudo bem. Isso é só porque são ordens de Ramsus – e suspirou aborrecida – Agora, ele nos colocou protegendo esse lixo... Bem, é assim que é pessoal – ela disse, voltando-se para os três oponentes – Ia ajudar se vocês se apressassem e perdessem logo.
_ Mas afinal, quem são vocês? – Billy perguntou, incomodado – Não temos tempo a perder falando com as duas!
_ Bom, eu ‘sinto muito’! – Tolone parecia ofendida – Mas não podemos deixar vocês irem ainda. Na verdade, não ligamos tanto assim pra Krelian, mas se fizermos um serviço porco vai deixar Ramsus mal. Mas, graças a vocês, tolos, que reviveram ela, podemos terminar essa missão mais cedo do que esperávamos.
_ É – confirmou Seraphita, curvando a cabeça em agradecimento – Não sabíamos como operar aquele maquinário todo, então ficamos tão confusas! Muito obrigada pela sua generosa ajuda!
Billy e Citan tinham expressões de extrema confusão nos rostos, apenas Elly outra vez parecendo embaraçada, imaginando o que Ramsus diria se ouvisse àquilo. Pôde fazer uma boa idéia ao ver a reação de Tolone:
_ Ai, Sera... Não conte isso a eles! Logo quando eu estava armando as coisas pra nos fazer soar psicologicamente superiores! Droga...
_ O quê! – Seraphita tornou a sacudir a cabeça daquela forma infantil – Mas... Quando as pessoas te fazem uma gentileza, você deve dizer ‘obrigada’! É o que minha vovó sempre dizia... Mas, estou impressionada, Tolone! ‘Psicologicamente superiores’? Seu implante ciborgue cerebral de ‘Futon de Gim Tônica’ te fazem parecer esperta, com certeza!
_ É ‘Cérebro Foto-Positrônico’, sua idiota! – esbravejou Tolone – ‘Futon de Gim Tônica’...? Você me faz parecer uma bêbada dorminhoca!
“Já é ruim o bastante como está – pensou Tolone – ‘Cérebro Ciborgue Foto-Positrônico...’ Vai acabar nos pondo em apuros com aquele pessoal que fez ‘Star Treco’!”
_ Tomem cuidado! – Elly alertou, pondo-se em guarda – Os Elementos são as lutadoras de elite de Ramsus... Parecem inofensivas, mas são muito perigosas.
_ Então, mesmo essa conversa delas foi planejada... – murmurou Citan, impressionado. Mas Elly acenou com a cabeça, outra vez parecendo corada.
_ Não, é assim que elas são normalmente! É o que as torna realmente perigosas!!
_ Então não vamos perder tempo! – Billy apontou as pistolas e comandou – Citan, eu abrirei caminho enquanto você passa por elas...!
Tolone agitou o braço direito e um tornado de ether se manifestou, arrastando Billy e Citan para trás à força, e Elly se manteve onde estava à força, o bastão à sua frente bloqueando o ataque que reconhecia, fortalecendo o poder de ataque de Tolone enquanto os afastava e dava tempo a Stone de fugir.
E Seraphita a atingiu, saltando na corrente de ar de Tolone e se deixando levar para golpear Elly enquanto ela estava ocupada se defendendo do turbilhão de sua colega. Fora só a primeira investida das duas, e os três estavam caídos no lado oposto da sala.
_ Bem, é como dissemos – Tolone sorriu levemente – Não podem sair daqui ainda. Seraphita?
Seraphita acenou para eles e um ‘Thermo Dragão’ semelhante aos de Elly causou uma erupção de fogo onde estavam, e os três dispersaram. Rolando no chão e sacando as pistolas, Billy abriu fogo contra Seraphita, fazendo-a recuar e se preparando para um ‘Gunholic’, mas Elly gritou do lado oposto:
_ Billy, não as atinja com ether! – ela ergueu-se, investindo contra Tolone, em seu ataque ‘Travessia’ – Tolone e Seraphita podem...!
Para surpresa de Billy e Citan, Tolone repentinamente soltou seu antebraço direito e apontou um microdisparador positrônico embutido nele para Elly, neutralizando o ataque dela e lançando-a de volta pela sala.
_ Podemos, sim. Mas mistério é bom para a reputação, e você não precisa contar...
_ É, não ia ter graça se dissesse que nosso treinamento em Jugend faz a gente absorver ataques de ether – Seraphita concordou, de braços cruzados e parecendo séria, recostada na porta – Não é isso, Tolone?
_ Sera... – Tolone olhou para a colega com impaciência – Não adianta nada eu me esforçar pra manter ela quieta, se você vai e conta pra eles logo em seguida! Não dá pra simplesmente ficar quieta e lutar?
_ Hein? Mas Tolone – Seraphita outra vez sacudiu a cabeça como uma garotinha – Eu só queria...
Citan aproveitou-se do momento para alcançar Elly e lançar seu Sazanami sobre ela, recuperando algo de seus ferimentos. Era um grupo diferente dos Elementos que ele conhecia, e era ela quem saberia lidar melhor com as duas. Billy, enquanto isso, disparou à esquerda e direita para afastar as duas e ganhar tempo.
_ Elly! Elly, você está bem? – perguntou Citan, curvado sobre ela – Agüente firme!
_ Se não passarmos por essas duas – Elly murmurou – Stone pode acabar fugindo... E-eu preciso...
_ Acalme-se! Você precisa de mais tempo...
Billy tombou novamente, e desta vez era ele quem parecia muito ferido. Citan levantou-se, pondo-se em guarda para lutar, mas Elly levantou-se também e colocou o bastão diante dele.
_ Espere... Tome conta do Billy, Citan, e seja rápido. Vou precisar de vocês dois.
_ Anda, pra quê tornar isso tão demorado? – Tolone perguntou, com ar de impaciência – É só vocês ficarem um pouco no chão! É tão difícil assim fazer isso?
_ Mais... do que imagina, Tolone.
Algo dentro de Elly se agitou; pela segunda vez, homens haviam descido ali para levar a menina. Outra vez, ela não estava conseguindo impedir que levassem...
... Esmeralda...!
Elly apontou seu bastão para as duas e concentrou-se, preparando-se para atacar com ether. Era tolice atacar a dupla de Elementos diretamente, mas de alguma forma, ela se lembrava daquele laboratório. E lembrava-se do reator onde a colônia de nanomáquinas fora cultivada; um reator que usava gases para resfriamento. Gases conduzidos por tubulações localizadas exatamente acima de onde Tolone e Seraphita estavam.
Erguendo o bastão para o batente da porta sobre as duas, Elly chamou:
_ Lança de Terra!
O batente despedaçou-se, e também os condutores sob ele, espalhando gás extremamente frio sobre Tolone e Seraphita. Elas eram capazes de absorver a energia ether dos ataques, era verdade, mas aquilo não era um ataque de ether, e ambas apressaram-se para o centro da sala, gritando com o frio.
_ Agh! O q-que é...? F-frio...!
_ Aaaaaah! – Seraphita estava de mãos unidas novamente, tentando sem sucesso afastar as camadas finas de gelo de seus cabelos e ombros – Frio demais...! Espera, Tolone, eu resolvo... Thermo Dragão!
Ao comando dela, chamas explodiram sobre as duas, derretendo o gelo e tornando a aquece-las. Teria sido uma enorme tolice, não fossem ambas capazes de absorver a energia do ataque, e Tolone suspirou de alívio.
_ Ah, bem melhor...! É, Sera, dessa vez você caprichou. Muito bom trabalho!
_ Foi, não foi? – Seraphita sorriu, outra vez parecendo uma garotinha – Eu não gosto de frio, dá a impressão que a gente está...
_ Travessia!
Elly havia planejado quase tudo aquilo; não esperava que Seraphita usasse um ‘Thermo Dragão’ sobre as duas pessoalmente, mas tanto melhor, no fim das contas; facilitara em muito sua parte, e com seu ataque rápido, ela golpeou tanto Tolone quanto Seraphita e alcançou Billy e Citan, que tinham aproveitado o tempo concedido para se recuperar.
_ Billy, Citan, ataquem agora! Na direção da porta!
Citan à esquerda, Billy à direita, os dois atacaram ao mesmo tempo. Enquanto o catedrático alcançava Tolone e a atingia com seu ‘Reken’, um novo golpe de ataques manuais encerrado por um chute, Billy lançou Seraphita para trás com seu ‘Quebra Nozes’, e ambas tombaram na direção da porta, caindo no corredor e passando ainda uma vez sob os vapores já quase extintos da tubulação rompida. E a Elemento de cabelos prateados não gostou da sensação de dor.
_ Droga...! Sera, agora já chega! Vamos mostrar pra eles...!
_ Tolone, o seu braço!
O braço positrônico de Tolone estava rachado em mais de um ponto. Embora seus corpos pudessem resistir bem à maioria das agressões, tantas mudanças de temperatura em tão curto espaço de tempo tinham cobrado seu preço, quando somadas aos impactos dos golpes que tinham recebido. E Tolone ergueu os olhos, vendo Elly, Citan e Billy se aproximarem devagar. Diferente de Dominia, no entanto, ela sabia quando abandonar uma batalha.
_ Seraphita!! Já basta. Fizemos o trabalho que foi requisitado. Vamos nos retirar!!
E saiu depressa pelo corredor, ao que Seraphita gritou enquanto ia atrás dela:
_ Aaah!! Tolone! Espere por mim!
E as duas desapareceram no corredor, seguidas de perto por Citan, Billy e Elly. A sala de pressurização, no entanto, não podia ser aberta enquanto outros a utilizavam e o trio teve que aguardar por segundos preciosos antes de seguir em perseguição.

 Na ala médica da Yggdrasil, Fei continuava a dormir. Mas seu sono era inquieto, repleto de vozes e imagens nada familiares. E nada reconfortantes, tampouco.
... Nossa existência amaldiçoada ligada à terra...
Um pulsar alto. Como se o som de seu coração tivesse sido amplificado. Ou não era o seu coração?
Ó veículo abençoado... Criado para remover aquele ‘jugo’...
Havia uma sala, com um cilindro repleto de um líquido esverdeado. E uma garotinha de cabelos verdes flutuando nele. E o pulso alto continuava. Fei, vestido com um avental branco de médico, ou cientista, estava parado atrás das portas de vidro verde que lacravam aquela sala. Elly jazia do outro lado, sangrando muito, e tropas empunhando rifles fumegantes se aproximavam.
Ela ergueu-se com dificuldade, levantando a cabeça emoldurada pelos lindos cabelos vermelhos, forçando um sorriso doloroso na direção dele enquanto alguém dizia:
“Eu simplesmente não posso... entregar nossa filha... a vocês...”
Vários soldados parados, apontando suas armas para Elly. Uma pulsação. Outra. Mais uma.
...! ...! ...! Não! Parem!
O pulso. Aquele médico que era Fei, mas não era, observando o que acontecia com aquela garota vestida de enfermeira que era Elly, mas não era, e o pulso se tornou mais alto e seqüenciado. Tudo à volta dele pareceu estremecer enquanto o médico batia os punhos contra a porta de isolamento e um crucifixo balançava de um lado para o outro.
O médico agora estava num lugar escuro e um garotinho de cabelos sobre os olhos observava. E o crucifixo cintilou à meia luz.
“Hee hee hee... hee hee hee... Até mais...”

A enfermeira da Yggdrasil voltou; estava na hora de verificar as condições do paciente, mas ele não estava em lugar algum.
_ Hã? Para onde foi o Fei...?

Nas ruínas de Zeboim, enquanto isso, Elly, Citan e Billy davam perseguição a Stone e seu grupo. Tolone e Seraphita não estavam em lugar algum onde pudessem encontra-las, até que o trio finalmente alcançou o grupo do bispo, mais vagaroso, já na passarela de vidro onde toda a cidade podia ser vista à altura, e Citan bradou:
_ Bispo Stone!! Espere!!
Soprava um vento encanado dos níveis superiores ali, e Stone voltou-se com ar contrariado.
_ Hah, Elementos... Vocês nem sequer são tão boas quanto dizem... Nem ao menos conseguem me conceder algum tempo.
_ Devolva isso.
Stone, os soldados de Solaris e também Citan, Elly e Billy se surpreenderam, porque aquela voz era desconhecida, e parecia vir de lugar nenhum. E insistia, num tom inexpressivo.
_ Devolva, devolva!
Billy nervosamente tocou as pistolas na cintura, Citan e Elly se puseram em guarda, procurando ao redor. Nada, a princípio.
E então um Gear vermelho com asas verdes de energia pura surgiu do nada. Citan foi o único a perceber que ele descera depressa, se imobilizando à direita deles; para os demais, parecia ter se materializado do nada, tão rápida e sutil foi sua chegada. E um pilar de luz escura formou-se sobre a passarela, anunciando a vinda do piloto.
Era um rapaz completamente trajado em rubro negro, alto, de cabelos longos cor de fogo e pele pálida, além de uma fisionomia estranha. Seus olhos transmitiam insanidade, pura e simples, mas também uma confiança tremenda. Era alguém que conhecia a si mesmo, e não parecia haver nada naquele mundo que pudesse detê-lo.
_ Ha hah... Hyah hah ha... Ha hahahahahahahahahahahahahahaha!! Ha ha – e voltou-se para Stone e os outros solarianos – Isso é meu. Devolva!!
_ O q-que você quer? – mesmo o arrogante Stone parecia inquieto. O recém-chegado parecia exalar morte – Q-quem é você?
_ Pra você, isso é só um brinquedo usado – o estranho respondeu, ignorando a pergunta – Então, devolva. Pertence a mim.
_ Quem é você? – Billy gritou do outro lado, de pistolas apontadas – Ao menos nos diga seu nome!
Com lentidão e indiferença, parecendo pela primeira vez fazer caso da presença de Citan, Billy e Elly, o desconhecido voltou-se e hesitou por um instante, como se considerasse se deveria responder ou não.
_ Nomes não importam... No entanto, se insistem... Id...

domingo, 1 de novembro de 2015

Capítulo Vinte e Oito

Capítulo 28: No Fundo do Oceano


_ Thames à vista!
A Yggdrasil se aproximara da Thames. Chegando à alta velocidade, eles foram avisados pelo oficial do radar que o ataque fora retirado, a nave cidade aparentemente bem sucedida ao tentar fugir da perseguição. Citan subiu com Bart e Billy até a cabine de comando, o Elevador Espiral aparentemente ileso, e foram recepcionados com satisfação pelo Capitão.
_ Ah, são vocês! Bem-vindos a bordo de novo! É bom tornar a vê-los!
_ Viemos o mais depressa que pudemos – Citan desculpou-se – Temíamos não chegar a tempo, mas vocês parecem ter lidado bem com a situação.
_ Mas é claro que sim, porque... – e o Capitão ergueu a bengala, apontando-a para frente.
_ Nós somos! – voltou-se para a esquerda.
_ Homens! – voltou-se novamente.
_ Do mar!
Mas havia um pouco menos de entusiasmo na celebração desta vez. Após um instante mantendo a pose, o Capitão voltou-se para os amigos com ar abatido.
_ Normalmente, é isso o que eu diria. Mas temos pessoas gravemente feridas na ala médica, alguns feridos fatais inclusive. Resgatamos a todos os que pudemos dos outros navios, mas...
E o Capitão, com a ajuda de Hans, fez um breve resumo do acontecido, até o momento em que a ‘coisa peixe’ tomou outra direção.
_ Até onde pudemos ver – disse Hans, apontando para a janela da ponte de comando – aquela coisa partiu rumo ao norte. Há uma área de escavação do ‘Ethos’ naquele rumo, onde há rumores de que descobriram algo realmente antigo.
_ Citan, eu não pediria por vingança – o Capitão disse em tom solene – Mas se vocês pretendem mesmo enfrentar aquela coisa escura, aceitem o meu conselho e tomem muito cuidado. Só precisaram de um disparo para acabar com a nossa frota e danificar a Thames. Vamos levar dias pra consertar todo o estrago e perdemos gente muito boa. Não temos condição de enfrentar aquilo, mas vamos ajudar vocês com qualquer coisa de que precisem. Hans! Avise o pessoal da área de suprimentos para abrirem o depósito. Nossos convidados podem pegar o que precisarem de lá, com livre acesso. Isso vai em nome dos nossos colegas feridos. Só vou pedir uma coisa a vocês; depois que isso terminar, venham nos contar como aconteceu. Nosso pessoal precisa saber que não passou por tudo aquilo em vão.
Parecia estranho ver o Capitão falando daquela forma, mas era compreensível, principalmente para Bart. Ele sabia bem o que era ter a responsabilidade por toda uma tripulação, e prometeu silenciosamente vingar o que a Thames tinha sofrido. Devia aquilo ao Capitão, e aos outros também.
Em algum ponto do oceano, um imponente Gear de bronze estava em modo de espera, de braços cruzados e ereto. Seus sistemas de auto-reparo há muito haviam sanado os problemas causados depois de sua última batalha, e seu mestre lutava para conter as poderosas forças em seu interior. Adquirir mais aquele poder valera a pena, mas por vezes o incomodava, e não tinha como evitar, levando em conta o que sentira. Era ‘ele’...!
Seus comunicadores receberam uma mensagem inesperada, e o rosto familiar de Miang formou-se em seu monitor principal.
_ ... Você notou? O Gear dele está tornando a despertar. Em breve, ele próprio também vai despertar.
Grahf não tinha nada a dizer. Claro que sabia disso. O que o intrigava era qual o interesse de Miang na questão. E a imediato de Ramsus logo esclareceu:
_ Os amigos dele estão indo para Zeboim. Já esteve selada há 4000 anos. Você sabe o que há lá melhor do que eu. Ele provavelmente não entregará nada a ninguém. Mas é algo de que nós dois precisamos. Sabe o que quero dizer?
Claro que ele sabia. Não era preciso dizer coisa alguma. Não obedeceria a ordens da mulher de cabelos púrpura, mas seus interesses também estavam em jogo. Não podia ficar parado.
_ ... Então, por favor.
O rosto de Miang desapareceu do monitor. E o Gear de bronze lentamente começou a erguer-se.
A Yggdrasil, devidamente abastecida, rumou na direção indicada pela tripulação da Thames, e não tardou para que encontrassem a área secreta de escavação do ‘Ethos’. Havia sinais de luta no exterior, o que os levou a supor que tropas de Solaris também tivessem atacado ali. Tudo estava silencioso, mas Citan e Billy tinham recentes demais as lembranças do acontecido no quartel-general do ‘Ethos’ para se arriscarem. Elly, no entanto, olhava para o elevador que conduziria ao interior da escavação com um ar indecifrável em seu rosto.
Estavam agora no elevador, e Billy estava pronto para sacar e atirar; até seria um alívio, depois da provação no ‘Ethos’, e de tudo o que Stone dissera. Mas ele ainda não entendia as motivações dos inimigos.
_ Citan, o que Solaris está tentando fazer? – ele perguntou quando o elevador terminou sua descida longa, diante da área de escavação. Mas mesmo o catedrático parecia em dúvida.
_ O exército principal de Solaris... Para quê... tudo isso...? Bem, vamos descer.
O trio seguiu em frente. Eles temiam o ataque de tropas de Solaris, ainda possíveis depois de dizimar os escavadores, ou mesmo monstros, freqüentes em áreas como aquela, mas a única coisa presente além deles era o silêncio, um tanto enervante. O grupo logo alcançou uma passarela de paredes de vidro. A iluminação artificial permitia uma ampla visão dos arredores, e era impressionante; estavam numa das áreas mais elevadas de uma vastíssima caverna, numa torre de saída. Lá embaixo, até onde a vista podia alcançar, prédios e ruas de uma cidade antiga espalhavam-se por toda a volta num cenário surpreendente.
_ Isso são... ruínas de uma cidade...! – murmurou Billy – Eu já tinha ouvido falar nela, mas...
_ Eu sei, eu a conheço bem... – Elly murmurou, caminhando para frente com um olhar vago e uma voz distante, sem parecer ela mesma – Sim... A cidade na caverna, Zeboim... Quando estávamos enterrados naquele vasto mausoléu...
_ Elly! Elly! – Citan estava alarmado, sacudindo a moça pelos ombros – O que foi!!?
A princípio, Elly apenas manteve o mesmo ar distante e entristecido, mas logo pareceu despertar, confusa, olhando ao redor como se não soubesse onde estava.
_ Hã...? O quê...? Eu por acaso...?
_ Não... – Citan estava cheio de alívio, e confuso. Aquilo não devia ser nenhuma seqüela da hipnose anterior, e isso era motivo de alívio. Mas, a forma como ela falara... – Vamos, é melhor seguirmos em frente.
O caminho conduzia sempre para baixo. Elly, Citan e Billy repararam, olhava para as ruínas por toda a volta com uma expressão estranha. Eles também estavam surpresos; mais de quatro mil anos não haviam bastado para deteriorar as paredes de metal em sua maioria, embora os sinais claros de abandono estivessem por toda a parte: teias de aranha, mofo e muita poeira. Mas o olhar de Elly parecia reconhecer as ruínas de alguma forma.
_ Um equipamento tão fantástico de isolamento numa instalação – comentou Billy, olhando em volta num corredor – Será que era um hospital? Mas, a cidade lá fora tampouco parece tão poluída...
_ Um equipamento de trancas de ar e saneamento muito severo – concordou Citan – No entanto, não parece operacional... O interior tão bem preservado, o exterior provavelmente também está...
_ Ah...!
Elly entrou na sala seguinte obrigando seus companheiros a voltarem até onde ela estava, olhando em volta com ar de assombro e reconhecimento para painéis computadorizados e uma janela opaca, o que novamente chamou a atenção de Citan.
_ Elly... Você se lembra de já ter visto isso?
_ S-sim... Eu me pergunto por quê..? – ela olhou em volta com uma expressão de pesar – É terrivelmente solitário... e familiar.
O computador da sala ainda estava operacional, e acusava uma emergência de nível cinco, o que mantinha o reator central isolado, bem como todos os acessos ao banco de dados do laboratório principal. Embora o trio persistisse na busca, no entanto, não pareciam estar fazendo mais do que andar em círculos.
_ Que prédio inconveniente... – queixou-se Billy – É como se estivesse recusando forasteiros.
_ ... Labirintos geralmente não são construídos para proteger contra inimigos... – ponderou Citan – Geralmente, são feitos para trancar algo em seu interior.
_ Não para manter algo para fora, mas para manter algo dentro... – Billy raciocinou – Me pergunto o que seria este ‘algo’?
Procurando mais adiante, eles finalmente descobriram o motivo para as portas seladas. Após uma fileira de escadas, uma voz eletrônica barrou seu acesso a uma das portas, anunciando:
_ Área isolada. O botão de emergência dentro do reator foi ativado há 34999999 horas atrás. A partir deste ponto, há o risco de nanocontaminação. Quando penetrar na sala, por favor execute uma análise manual e confirme a segurança. Depois da confirmação, por favor, reinicie o nível de emergência no terminal mais próximo. Efetuar análise?
Citan operou o painel da porta, e o trio foi analisado pelo leitor ótico da porta, que logo registrou não haver nanocontaminação. No entanto, antes de entrar na sala, eles tiveram que recuar até o terminal mais próximo para reiniciar o nível de emergência. Ao penetrarem pela porta selada, tiveram que aguardar enquanto os sistemas reduziam a pressão do ar sensivelmente, e Citan não deixou de se admirar:
_ Este nível está completamente ativo, mesmo depois de tanto tempo...!
Elly subitamente passou por eles, Billy e Citan olhando sem entender enquanto a moça entrava num corredor de luzes vermelhas, selado por portas de vidro verde. Sua expressão era de dor e ela estava de mãos juntas, enquanto murmurava de maneira quase inaudível:
_ ... Sangue... Coberta de sangue... Meu... sangue... Não havia dor alguma... Apenas... frio... e tristeza...
_ Elly...!
_ Ela esteve aqui, completamente sozinha, durante este tempo todo... – Elly parecia alheia a tudo, saindo pelo corredor atrás dos dois como se eles nem estivessem ali. E Citan olhou em volta, analisando.
_ Sangue...? – examinou o metal próximo à porta mais detidamente, encontrando pequenas marcas nas paredes, e manchas escuras – Certamente está coberto de sangue... E isto... Calor excruciante... Não, talvez seja radiação? Talvez seja um sistema de desinfecção de emergência... Estas marcas são evidência de que ele foi usado...
Um som de máquinas se fez ouvir nos fundos, e Billy e Citan voltaram–se surpresos. Numa sala ao lado, Elly estava operando os painéis antigos com segurança, como algo que ela sempre fizera, e enquanto as telas enchiam-se de palavras e sinais tão antigos que não fariam sentido para qualquer pessoa viva, Elly uniu as mãos novamente e disse baixinho:
_ Ó veículo para uma nova alma! Que o espírito que habita em ti encontre a paz.
Foi de cabeça baixa diante dos monitores, ainda mostrando vários programas em execução, que Citan encontrou a moça, e advertiu:
_ Elly, não! Não sabemos o que poderia acontecer!
Elly voltou-se com ar triste para Citan, e ele sem entender por que sentiu pena. Acompanhada de um temor desconhecido.
_ Citan... Quem... sou eu...? O que estou fazendo? O que estou dizendo...?
Não havia resposta que o catedrático pudesse oferecer, uma vez que ele incomumente não tinha a menor idéia do que estava havendo. Nada parecia poder explicar a familiaridade de Elly com aquelas ruínas antigas. E Billy, ainda no corredor de portas seladas, voltou-se ao ver um cilindro repleto de um líquido esverdeado erguer-se no meio da sala, e bolhas erguendo-se em seu interior. Aos poucos, enquanto a espuma formada se alternava com o líquido, o corpo de uma menininha de, no máximo, nove anos de idade se fez presente, seus cabelos verdes flutuando no interior do cilindro. O trio espalhou-se ao redor do cilindro, e Billy indagou:
_ Citan... Essa menina...? Como ela subitamente mudou para a forma humana?
_ Esta menina parece ser uma forma de vida artificial criada dentro do reator – Citan respondeu, olhando pensativamente para a criança flutuando no cilindro – Ela provavelmente foi montada no reator usando-se aquela série no banco de dados da sala de controle. Provavelmente, o corpo dela foi...
_ ... construído de máquinas autônomas numa escala molecular – completou uma voz no corredor, fazendo-os voltarem-se – Em outras palavras, uma colônia de nanomáquinas.
Stone entrou na sala seguido de oito dos assassinos vestidos de clérigos que antes tinham sido vistos no ‘Ethos’, e mais duas garotas em uniformes de Solaris que se detiveram na porta. Sem qualquer cerimônia, o bispo disse:
_ Vou levar essa colônia de nanomáquinas comigo, obrigado. Essa é a existência, ou o fator chave, com o qual Deus vai nos guiar para libertar a humanidade de seu jugo. Então, se não se importam...
Alguns dos solarianos vestidos de clérigos foram aos painéis e fizeram com que o cilindro se suspendesse, o líquido se desfazendo numa névoa branca suave enquanto a menina parecia aguardar pelo que seria decidido com um olhar sem expressão. E Billy tocou nervosamente suas pistolas.
_ Bispo...
_ Ah, Irmão Billy, está aqui também. Isso torna as coisas mais simples. Eu sei que vai entender... Esta colônia de nanomáquinas precisa estar nas mãos de uma pessoa honrada. Está destinada a ser a ‘salvação da humanidade’.
_ Uma pessoa honrada? – Billy indagou friamente – Eu certamente não acredito mais que você seja honrado. Eliminar o ‘Ethos’ e qualquer humano da superfície que não concorde com a sua vontade...
_ Qual o problema em eliminar aquelas pessoas que não sejam adequadas para a ‘salvação’? Se, nossa própria fé não é baseada no preceito de que ‘apenas os escolhidos serão salvos’?
_ ... Há algo muito errado com isso – replicou Billy – Salvação pela fé é algo que todos deveriam ter uma oportunidade igual de alcançar.
_ Está dizendo que pode salvar toda a humanidade? Se Krelian usar a colônia de nanomáquinas, ao menos podemos salvar alguns poucos escolhidos. Mas vocês não entendem como utilizar isto. Não podem salvar ninguém. Pretende assumir a responsabilidade pela perda que vai causar à humanidade?
Billy não sabia o que dizer. Havia algum fundamento no que Stone dizia, talvez, mas ele sentia em seu coração que aquilo estava errado. Não podiam perder a humanidade inteira, mas tampouco podiam condenar os ‘não-escolhidos’. E o método de seleção do bispo, dado o que ocorrera no ‘Ethos’, não parecia muito correto. E Stone prosseguiu:
_ Meu trabalho agora é levar esta colônia de nanomáquinas para Krelian. Perceba, diferente do ‘Ethos’, nosso objetivo não são as armas antigas que jazem nas ruínas da cidade. Eu não penso que estejamos em conflito com seus interesses.
_ Não! – Elly se opôs – Não podemos permitir que eles levem essa criança!
_ Salvação ou não – Billy apontou uma pistola para um dos clérigos, fazendo-o deter-se – O que estão planejando fazer com essa menina?! Tudo o que sei é que seus feitos não são honrados. Bispo... Lamento dizer isso, mas... Não posso ser parte do que você tem intenção de fazer.
_ Vejo que não pude fazê-lo entender... – Stone comentou, um cintilar estranho nas lentes de seus óculos – Então, não pode ser evitado... Não tenho o tempo para insistir em convencê-lo. Por favor me perdoe, já que devo me apressar.
E voltou o rosto para as duas moças na porta, dizendo:
_ Desculpem deixar as duas damas esperando... É hora de fazerem seu trabalho, Elementos.