Capítulo
63 – O Primeiro e o Último
O
alvorecer cintilou sobre a superfície metálica de Deus, a arma planetária que
agora convertia todo o planeta num ritmo constante, toda a área ao redor sendo
assimilada e transformada em metal num processo inexorável. De sobre o oceano, o
sol cintilou também sobre a nave de batalha Excalibur, de Shevat, que se
aproximava cada vez mais. Em seu interior, a tensão era enorme.
_
Nada ainda? – a comandante perguntou.
_
Não, senhora – o oficial de radar replicou – Leituras de energia, e sensores de
movimento, inalterados. Não há reação perceptível.
_
Não tô gostando disso – Bart resmungou – Como Merkava, aquela coisa tinha um
canhão e uma barreira tão fortes que tivemos que improvisar, e agora, chegamos
perto assim sem provocar reação. Citan, o que acha?
_
É apenas um palpite – o doutor ajustou os óculos sobre os olhos – Mas, se
levarmos em conta o processo de terraformação... Talvez, Deus esteja consumindo
energia demais para empregar armas de reação, ou canhões de longa distância. E,
nesse caso, deveremos enfrentar outro tipo de resistência.
_
Movimento!
Jerico
deu o alerta, e tanto na Excalibur quanto na central de comando da Yggdrasil
III, os sensores focalizaram a estrutura metálica imensa diante deles. E ela
parecia estar se desfazendo como neve a princípio, até que todos puderam
enxergar melhor.
_
Gears...? Não – Jerico meneou a cabeça – São Anjos Seraph, de tipos e tamanhos variados!
Todos convergindo em nossa direção! Tempo estimado de chegada... Quinze
segundos!
_
Naturalmente – Citan acenou, como se visse suas suspeitas confirmadas – Sem poder
empregar energia em excesso, a melhor saída é empregar unidade autônomas, que
devem funcionar como ‘anticorpos’ em um organismo. Cada Seraph conta como um Gear
independente, e gerados e mantidos pelas nanomáquinas, devem consumir muito
menos energia, em comparação com grandes canhões ou projetores de reação. Mesmo
em grande quantidade.
_
São muitos – Sigurd murmurou, admirado e assustado, observando o monitor
principal da Yggdrasil III – É como se Deus estivesse se desfazendo ao vento.
_
Tanto faz, o primeiro movimento é nosso – Rico resmungou, cerrando as mãos nos
controles do Stier, e Bart concordou.
_
Abrir fogo! Eles podem estar economizando energia, mas nós não! Vamos abrir
caminho entre esses anjos como der, mas precisamos alcançar Deus, custe o que
custar!
A
Excalibur tomou a dianteira, seus canhões de cano triplo disparando torrentes
de energia que pulverizavam os Seraph, deixando apenas nuvens de fumaça e
destroços em seu caminho. Mas o número de unidades era absurdo, e mesmo a salva
de tiros da nave de batalha não era capaz de abater a todos. E era questão de
tempo antes que se encontrassem.
_
Yggdrasil, iniciar salva de apoio! – Sigurd comandou – Carregar artilharia
Anti-Gear especial, em prontidão para disparo! Baterias de apoio, preparar
mísseis de proa para lançamento imediato, ao meu sinal!
_
Melhor sairmos também... – Fei propôs, mas Citan o deteve.
_
Espere, Fei! Lembre-se do plano! Devemos aguardar tanto quanto possível antes
de agir.
_
Mas...
_
Uma vez dentro da estrutura de Deus, a Excalibur e a Yggdrasil não poderão nos
ajudar – Citan insistiu – Estaremos por nossa própria conta, sem qualquer apoio
externo, enfrentando defesas que ainda nem conhecemos. Precisamos poupar nossas
forças enquanto pudermos.
_
Segura aí, Fei, nossa hora vai chegar – Bart acompanhava a movimentação externa
através de seu monitor, conectado à tela principal da Yggdrasil III – Cara, tem
bicho demais lá fora...
_
Canhões de estibordo, abrir fogo! – Sigurd comandou – Torres ‘Anton’ e ‘Belta’,
iniciar fogo alternado, varredura em arco amplo, abram caminho para a
Excalibur! Iniciar cobertura de apoio!
A
Yggdrasil manobrou, posicionando-se sobre a Excalibur enquanto seus mísseis
eram despejados num arco de disparo perfeito, atingindo a linha de frente dos
Seraph e reduzindo o número de alvos para os canhões intermitentes da nave de
Shevat, que já estava atropelando unidades inimigas com seu imenso escudo protetor,
abrindo caminho entre as nuvens de opositores como um navio entre as águas.
Ao
menos, era a idéia inicial. Assim que as primeiras levas de Seraph começaram a
se chocar contra o escudo, porém, os solavancos começaram uma trepidação intensa
por toda a nave, e o som de metal se chocando contra o casco ficava cada vez
mais alto. Algo estava errado.
_
Relatório!
_
Majestade, o número de Seraphs é grande demais – o navegador respondeu à Rainha
Zephyr – Por mais deles que destruamos, a quantidade que chega até nós é absurda.
Estão nos atacando diretamente; nossos escudos estão ficando sobrecarregados
depressa.
A
tela principal ilustrava bem o que o navegador dissera. Inúmeros Seraph, de
formas variadas, continuavam a se destacar da estrutura principal de Deus, em
direção a eles, e alguns já estavam aglomerados sobre o escudo protetor da
Excalibur, muitos já golpeando a barreira. Os projetores de escudo de uma nave
daquele porte poderiam resistir indefinidamente a Gears comuns, mas o poder e a
quantidade dos Seraph estava levando as proteções ao seu limite depressa.
_
E ainda estamos afastados demais – Taura, também a bordo da ponte de comando, murmurou,
voltando a atenção para o monitor externo. Deus crescia diante deles, ficando
mais próximo... mas lento demais. Mesmo com o fogo de cobertura da Yggdrasil,
não parecia possível cobrir aquela distância antes que fossem apanhados.
_
Concentrem a energia da barreira em forma de cunha, com ênfase na proa – Zephyr
comandou – Precisamos levar o grupo de invasão tão próximo da entrada quanto
for possível; é tudo o que poderemos fazer.
_
S... Sim, senhora – o oficial de comando respondeu, parecendo em dúvida – Mas,
uma vez que alcancemos a entrada, nossas chances de nos afastar serão...
_
Se eles falharem, não teremos para onde nos afastar – Zephyr meneou a cabeça – Lembre-se,
eles são a última esperança que temos de deter a conversão do nosso mundo. Sigurd,
nos acompanhe! Vamos acelerar!
Os
solavancos ficaram cada vez mais intensos. A distância ainda era demasiada, os
canhões da Excalibur e os lançadores de mísseis da Yggdrasil destruíam a nuvem
de Seraphs aos montes, mas aqueles que chegavam perto o bastante se acumulavam
sobre as barreiras de energia, e seus ataques estavam ficando pesados demais;
os escudos de ambas as naves cederiam em breve.
_
Aí, não falei? – a voz de Bart se fez ouvir na ponte de comando da Excalibur – Nossa
hora chegou! Tá, um pouco antes do que eu pensei, mas tudo bem.
_ Bart?
_
Chu-Chu, Billy, Emeralda, comigo! – Zephyr ouviu a voz de Fei – Precisamos
tirar esses Seraph de cima da Excalibur e protege-la até chegar a Deus! Bart!
_
Tudo bem por aqui, Fei. Citan, Rico, Maria, comigo! A Yggdrasil protege a
Excalibur, e ‘nós’ protegemos a Yggdrasil! Não deixem essas pestes subirem a
bordo!
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