sábado, 19 de novembro de 2016

Capítulo Cinquenta e Um Ponto Dois

(...)


<Elly>


Quando Fei e os outros chegaram à parte mais profunda de Mahanon, eu estava tomando conta das pessoas recém-mutadas em Nisan.
Pessoas mutando, uma após a outra.

Como num eterno pesadelo, que fez com que me perguntasse exatamente quanto mais teríamos que continuar cuidando deles...

Elly afastou-se dos pacientes, indo até a janela da Sala de Reuniões de Nisan, onde os pacientes recém-chegados estavam sendo mantidos e tratados, e olhou para fora com ar cansado. Sua mente e seu corpo estavam divididos naquele momento, e não conseguia se concentrar.
_ Você está bem?
Voltando-se, Elly deparou com a preocupada Margie, que tocou sua fronte e olhou bem para seu rosto.
_ Você não descansou nem um minuto, não foi? Eu posso cuidar das coisas sozinha por algum tempo. Por que você não sai para dar uma volta?
_ Obrigada – Elly meneou a cabeça – Mas eu vou ficar bem. Prefiro me manter ocupada, assim não vou me preocupar demais com as coisas.
_ Sério?... Ei! Elly, o que é isso?
_ Isto? – Elly remexeu em si mesma, seguindo o olhar de Margie até encontrar o crucifixo que Fei deixara.
_ Posso dar uma olhada?
Ainda no pescoço de Elly, Margie examinou o crucifixo atentamente por um longo momento antes de soltá-lo e concluir:
_ Exatamente como eu pensava... É o Pingente de Nisan. Mas, como foi que você o conseguiu, Elly?
_ É do Fei. Estou guardando para ele. Mas... – e Elly apertou o crucifixo entre seus dedos – A sensação é como se eu sempre o tivesse usado...
_ Hmmm – Margie afastou-se, voltando para olhar o semblante de Elly sob a luz da janela – Quando usa isso, você parece ainda mais com Sophia!
_ Mesmo? Hmm – Elly sorriu – Ficar me elogiando não vai levar a nada, viu? Bom, precisamos nos apressar e testar o novo supressor de mutação naquelas pessoas ali. Não podemos deixar que eles mudem ainda mais... Ah!
Enquanto voltava para o salão principal, Elly sentiu a corrente do crucifixo afrouxar-se de repente, e o pingente soltou-se, batendo contra o soalho com um retinir metálico de mau presságio.
_ Oh não... Aconteceu alguma coisa com Fei e os outros!
E sem dar atenção a quem quer que fosse, Elly correu para fora.

Tomada por um medo indescritível, eu decidi ascender até Shevat, que estava estacionada nos céus acima de Nisan. Esperando por mim havia uma transmissão de Krelian...

Ele me disse que se eu quisesse salvar Fei e os outros, eu teria que ir até Golgoda.

Krelian queria a mim.

A fim de salvar Fei e meus outros amigos, eu parti no último Omnigear restante em Shevat.

Meu medo prévio de utilizar essa máquina foi sobrepujado pelo meu desejo de resgatar as pessoas importantes para mim.

Regulus, era o nome pelo qual as pessoas de Shevat se referiam àquele Omnigear que tanto lembrava Vierge. Mais curiosa que o nome era a sensação de imensa familiaridade e tristeza que parecia permear a cabine do piloto desde o momento em que Elly tomara seu assento. E, mesmo sem nunca ter pilotado um Omnigear durante toda a sua vida, a moça sabia exatamente o que fazer e como operá-lo.
A intenção de Elly era partir sem causar comoção, mas ao captar a aproximação de cinco outros objetos voadores menores se aproximando em sua retaguarda, ela soube que não tivera sucesso. E sabia quem a estava seguindo.
_ Está falando sério quanto a ir sozinha, chefe?!
Renk, em seu Atirador, seguindo adiante dos outros quatro Cavaleiros da Gebler. Detendo-se no ar e voltando-se para eles, ela estabeleceu contato entre os comunicadores de todos.
_ Krelian me disse para ir sozinha. Não posso me permitir quebrar o acordo. Então, por favor, fiquem para trás e protejam a todos aqui.
_ Mas é uma armadilha! – Helmholz avisou.
_ Eu sei.
_ Então, por quê...? – perguntou Stratski.
_ Se eu não for, Fei e os outros serão executados com certeza – Elly meneou a cabeça – Krelian não se importa com mais ninguém, exceto eu.
_ Então, o que te faz pensar que ele vai manter sua parte na barganha? – quis saber Renk – Você tem algum modo de saber que definitivamente vai salvar seus amigos fazendo isso?
_ Não...
_ Tá vendo? Então é suicídio! – forçou Vance, e Regulus deu as costas a eles.
_ Pode ser. Mas... Eu cheguei tão longe por causa de Fei e dos outros... Porque eles me aceitaram como sua amiga.
_ Se você for embora – Renk perguntou – E quanto a nós...? E quanto a todas as pessoas que reuniu em Nisan, que está deixando para trás? Todos estão contando com você para ter apoio espiritual.
_ ... As pessoas em Nisan ficarão bem – Elly conseguiu sorrir – Eles podem ficar de pé por si mesmos sem qualquer apoio da minha parte... E isso também é verdade pra vocês todos, certo?
_ Mas – quis saber Broyer – Por que você faz tanto por ele...?
_ Eu não sei... Acho que é a prerrogativa de uma mulher ser egoísta... talvez.
_ Prerrogativa de uma mulher...? – perguntou Helmholz, confuso.
_ Eu não sou uma mulher santa de qualquer espécie – Elly meneou a cabeça, sorrindo serenamente – Sou só uma mulher comum. Eu me zango... Eu choro... Eu rio... Mesmo que às vezes eu possa me ressentir das pessoas, também sei como amá-las. Amar multidões inteiras às vezes... e amar apenas uma pessoa pelo resto do tempo.
E ela uniu suas mãos diante de si e baixou os olhos, seu Gear movendo-se como ela.
_ Eu fico na benção suprema quando sou abraçada pelo homem que eu amo. Dando o que tenho a ele, e recebendo o que ele me dá, nós nos tornamos uma só carne... Este é o momento em que eu fico mais em paz. É simplesmente minha prerrogativa como uma mulher querer salvar o homem que eu amo!
_ Chefe...
Vance, como todos os outros, ficara profundamente impressionado com o que Elly dissera, e nenhum deles encontrava qualquer outra coisa para dizer. Novamente meneando a cabeça, ela pareceu despertar.
_ Me desculpem... por dizer coisas tão egoístas. Eu vou agora, e farei tudo o que puder pelos meus amigos. Então, eu quero que vocês todos façam qualquer coisa que puderem pelos nossos amigos aqui. Bem... É melhor eu ir andando.
Não havia mais o que ser dito, ou modo de fazer com que ela mudasse de idéia. Nenhum dos cinco podia pensar em coisa alguma, nem mesmo Renk, e Elly partiu. 



COM OLHOS QUE VIGIAM O MUNDO

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