domingo, 7 de fevereiro de 2016

Capítulo Trinta e Cinco

Capítulo 35 – Omnigear



_ Bem, então vamos andando. Onde fica esse mausoléu?
Fei, Billy, Bart e Margie estavam do lado de fora da sala de reuniões. O restante do grupo se despedira e partira na Yggdrasil para tentar a retomada de Aveh, agora mais confiantes na força que tinham e na provável fraqueza das forças de Shakhan. Em Nisan, no entanto, o quarteto estava mais preocupado com a tarefa diante de si, e Bart explicou:
_ Tem uma entrada nos fundos da catedral. Então, primeiro que tudo, temos que chegar na estrada que corre ao redor dessa cidade, e entrar pelo caminho dos fundos.
_ Qual a distância aproximada desse lugar? – indagou Billy, e Bart o tranquilizou.
_ A distância até o mausoléu não é tão grande. Mas, eu não sei quanto mais tem a partir de lá.
_ Você nunca esteve lá dentro em pessoa, Bart?
_ É, Fei... Essa também vai ser minha primeira vez além do mausoléu.
_ Bem, o local é totalmente selado – comentou Margie – Mesmo eu nunca fui muito adiante dentro dele.
_ Então, nem Margie nem eu sabemos muito a respeito dele. E, como Sig e os outros já decolaram, não vamos poder voltar pra nave por um tempo. Por enquanto, vamos simplesmente ter que trabalhar nisso por nós mesmos.
_ Muito bem então – Margie disse, mediante a concordância dos outros – Eu vou na frente e espero por vocês na entrada.
_ Te alcançamos assim que terminarmos nossos preparativos. Pode esperar por nós lá na entrada até então?
_ Tá, Bart. Até mais, então.
_ Beleza... – Bart voltou-se para os amigos depois que Margie se foi – Vamos nos preparar.
_ Mas, pelo que está parecendo – Fei observou – eu não acho que vamos encontrar a dona da loja.
_ Hmm – fez Bart – E por que nós simplesmente não deixamos o dinheiro necessário no balcão, então? Tá, podem não ser bons modos, mas eu tenho certeza de que eles me perdoam...
Feitos os devidos preparativos, os três seguiram o caminho que partia do centro da cidade e rodeava o lago de Nisan, e atrás da catedral encontraram Margie diante do que parecia um inocente depósito; na verdade, a entrada para o mausoléu subterrâneo. A porta já fora destrancada até que chegassem, e os quatro viram-se diante de uma escadaria mal iluminada que conduzia mais e mais para baixo.
_ Eu não fazia idéia de que havia um caminho escondido por baixo da catedral – comentou Fei – Então, o mausoléu é aí dentro?
_ É, geralmente fica fechado – explicou Bart – Se a cidade algum dia estiver em perigo, o povo supostamente deve se refugiar aqui dentro.
Os quatro se entreolharam e então, num gesto de concordância mútua, começaram a descer. Por um lance de escadas eles desceram, e outro, uma pequena pausa e desceram mais. Ao passar por uma porta no entanto, vendo que havia mais degraus para baixo, Fei perguntou:
_ Espera aí! Afinal... até onde isso vai?
_ Aguenta firme – respondeu Bart – Só tem mais um pouco.
‘Mais um pouco’ quisera dizer mais de sete lances de degraus sempre para baixo, sem mais voltas, mas também sem parecer ter fim, até finalmente chegarem a uma porta que os deixou num salão maior. E Bart adiantou-se.
_ Estamos aqui.
_ Então... o que vai acontecer?
Pois Fei não podia ver coisa alguma que parecesse um caminho. O salão onde estavam era amplo, mas não parecia ser mais do que aquilo, e em nada se parecia com um mausoléu, embora tivesse sem dúvida o cheiro de algo muito antigo. E Bart acenou para ele.
_ Ei, dá um tempo, não me apressa!
Por um longo instante os quatro detiveram-se como estavam, e Billy, Fei e Margie voltaram-se para Bart. Seu único olho estava fixo adiante, como se estivesse vendo algo que o fazia ponderar profundamente. Ou se concentrar demais, e subitamente Fei entendeu.
_ Você, por acaso não...?
_ Não se esqueceu do que precisava fazer, não é...? – perguntou Billy, e Bart irritou-se.
_ Ô, dá um tempo e fica quieto!... Já faz um bom tempo, então não me culpem... Praga – ele balançou a cabeça, parecendo sem jeito – Esqueci mesmo.
_ Você quer que eu abra? – Margie perguntou, olhando com ar vazio para Bart. E ele pareceu a um instante de mandar que ela também ficasse quieta, mas talvez a urgência de sua missão ali tivesse despertado nele, porque sua expressão mudou e ele pediu:
_ Tá. Dá um jeito, por favor.
Sem qualquer hesitação, Margie adiantou-se e tocou uma parte da parede à direita, onde um painel cúbico enorme pareceu saltar da parede, e Bart bateu na própria fronte, claramente aliviado.
_ Ah, isso!! Hah! É, isso mesmo, é o que eu achei que era...!
Billy e Fei balançaram as cabeças, cada um se perguntando se tudo ficaria mesmo bem com tal liderança.
Mas Margie obviamente não estava tão confusa quanto o primo. De repente, com um som eletrônico, uma porta imensa de metal abriu-se como uma boca na parede, de certo modo lembrando uma plataforma de desembarque.
Imediatamente, guardas de Shakhan lá de dentro voltaram-se para eles e começaram a atirar, e Bart puxou Margie para um canto da parede para protegê-la da artilharia, enquanto Billy tomou posição à esquerda com Fei.
_ Tsc! – fez Bart – Já chegaram tão longe assim...!
Os disparos dos soldados obrigaram os três a procurarem cobertura, mas Billy também era um pistoleiro, e sacando ambas as pistolas respondeu ao fogo enquanto se jogava para direita e rolava pelo chão.
Fei e Bart aproveitaram-se da artilharia de Billy e se espalharam. Por um instante curto, os soldados também procuraram cobertura contra os disparos e isso bastava para eles. Quando tornaram a se mostrar, Fei saltou sobre eles com seu Hagan.
Outro soldado afastou-se e virou o rifle para Fei, mas Bart os estava alcançando e gritou:
_ Ei, palhaço! Olha pra cá!
A surpresa do soldado durou muito pouco, e ele teve tempo de mudar o alvo, mas Bart já estava próximo o bastante para bater seu chicote e puxar o outro pelas pernas. E enquanto o soldado caía, Bart o esmurrou e mandou para longe.
_ Hah, gostou dessa? Esse é o ‘Choque Rítmico’, idiota.
_ Bart, preste atenção! Tiro Guiado!
Um disparo de Chi de Fei atingiu em cheio um terceiro soldado, que praticamente pulou de costas ao tombar. E Bart agradeceu, meio sem jeito.
_ Ah, valeu aí Fei. Eu, er... não tinha visto aquele.
_ Precisa prestar mais atenção.
Mais tiros espocaram ao redor dos dois, e eles se jogaram ao chão. Ainda não tinha acabado, mais soldados estavam vindo do interior do mausoléu e disparando.
E Billy também estava disparando. Olhou ao redor, procurou por uma posição melhor de tiro e teve uma idéia, atirando para o alto. O mausoléu combinava tecnologia avançada com ornamentos antigos, e algumas das luminárias eram presas com correntes. O disparo de Billy soltou uma delas exatamente sobre os soldados, e ela arrebentou-se sobre eles enquanto se aproximavam.
Fei e Bart se levantaram. A luta tinha acabado, ao que parecia, e o pirata ergueu o polegar para Billy.
_ Valeu; acho que isso resolve. Agora, será que...
_ Guri??
_ É Bartholomew! E Marguerite está com ele, também! Ei, todo mundo! Está tudo bem!
Aos poucos, atraídos pelo som da batalha, os habitantes de Nisan foram surgindo e se aproximando, olhando com espanto para Bart e os companheiros. Apesar do alívio, no entanto, a mente do rapaz estava ocupada com outra coisa.
_ O sepulcro? A mãe da Margie está a salvo?
Margie correu para onde estavam depositadas as antigas Grandes Madres de Nisan, e por um instante não respondeu. Mas então, voltou-se com alívio e suspirou.
_ Está tudo bem! Ela não foi tocada.
_ Uau... Então, tudo bem. Que alívio! Er... – e só então Bart voltou-se com atenção para os aldeões – Então, está... Tá todo mundo bem?
_ Sim, de algum modo...
_ Shakhan... – Bart procurou em volta, como se pudesse ver o inimigo ali – Pra onde ele foi?!
_ Ah, sim, Shakhan? Não, eu não o vi – respondeu a dona da loja de itens – As únicas pessoas que vieram aqui foram aqueles soldados que me ameaçaram pra ficar quieta. Sinto muito, menino. Se ao menos eu tivesse sido mais corajosa...
_ Ele não chegou aqui ainda... Esquisito.
_ E lá...? O que está acontecendo com a cidade agora?!
A princípio, nenhum dos três, nem Marguerite, entenderam do que estavam falando. Foi Bart quem atinou primeiro com a preocupação natural do povo e os tranquilizou.
_ Ah, eu tomei conta da situação lá em cima. Tá tudo bem, já podem voltar!
_ É mesmo? – o assombro do prefeito não parecia ter limites – Bartholomew, você sem dúvida é poderoso! Eu tenho visto você vindo e indo de tempos em tempos e nunca pensei muito nisso. Quem é você, exatamente?
Fei e Billy trocaram olhares, enquanto os demais habitantes de Nisan pareciam olhar para Bart com uma curiosidade nova, como se algo que nunca tivessem percebido de repente viesse à tona. E o próprio Bart parecia encabulado, e mesmo sem saber por que, procurou apoio nos olhos de Margie.
_ Hã, todos vocês, eu preciso da sua atenção! Meu...
Sua prima estava sorrindo para ele. Serenamente, de uma forma que trouxe algum alívio à sua dúvida. Era verdade que parecia outra vez a impulsividade dele tomando conta da decisão correta, e que podia ser precipitado falar naquilo com Shakhan ainda à solta, mas o momento parecia... adequado demais para desperdiçar. Suspirando fundo, sabendo que não teria volta, ele prosseguiu:
_ ... Meus amigos estão atualmente indo para Bledavik. Eles estão numa missão pra tirar Shakhan do seu trono de poder. Há uma necessidade de reconstruir esse país de novo, do zero. E-eu... Eu herdei essa tarefa do nosso falecido rei.
Olhou ao redor. Sim, as palavras estavam tendo efeito. Devagar e sempre, ele prosseguiu:
_ Se tudo sair bem, vamos em breve ser capazes de tornar isso numa realidade. Por favor, acreditem em mim, e me esperem.
_ Você vai derrotar Shakhan?!
_ O... falecido rei...? Então, você é...
Bart baixou seus olhos. E viu que Margie concordou, acenando com a cabeça. Não tinha mais nada a dizer. E a dona da loja de itens tomou a frente, dirigindo-se aos vizinhos.
_ Vocês ouviram, a cidade está bem. Vamos voltar lá pra cima! Juntem todos seus pertences!
O povo de Nisan seguiu em procissão por vários minutos, reunindo suas coisas e saindo pela mesma passagem por onde Bart, Margie, Fei e Billy tinham vindo. Antes de ir, a dona da loja voltou-se para eles e disse:
_ Guri, veja se toma cuidado lá fora! – e sorriu – Eu sei que você vai conseguir. E, quando conseguir... tem que prometer que vai se revelar e anunciar quem você é. Quero ver você de pé no terraço do Castelo Fatima, orgulhosamente!
Bart concordou, acenando a cabeça e sorrindo. E ela se afastou alguns passos, ainda se voltando uma última vez.
_ Você tem que vencer, menino. Tem o meu apoio!
Os quatro ficaram em silêncio, os amigos esperando sem contestar enquanto Bart tentava se entender. Havia pensamentos para organizar, e todos respeitaram isso pelo tempo que foi necessário. Apenas quando o som dos passos do último aldeão desapareceram do corredor, ele disse:
_ Eu não sei o que aconteceu, ou o que me fez dizer as coisas que eu disse. Não é a minha cara dizer esse tipo de coisa...
_ Você podia ter simplesmente dito a eles que você era... o príncipe – Margie replicou, também olhando para adiante.
_ Não – Bart sacudiu a cabeça – Eu não posso fazer isso ainda. Eu preciso cumprir o último pedido do meu pai.
Seguiram por um elevador de vidro no centro do mausoléu, e de lá subiram por um tempo considerável até se verem diante de um corredor longo de metal. Não havia muita iluminação, e o silêncio era perturbador. Fei tomou a dianteira, esforçando-se sem conseguir vislumbrar coisa alguma.
_ ... Está terrivelmente escuro aqui.
_ Ah, provavelmente eles deixaram a força desligada, porque não tem ninguém aqui – Bart comentou casualmente.
_ Nós usamos esse nível inferior como um mausoléu – explicou Margie – então, ele sempre tem o mínimo de energia disponível para uso. Mas, nem mesmo as irmãs têm permissão de vir aqui.
_ Deve ser por isso... – Billy conteve um espirro – que o lugar cheira a mofo...
_ Isso é óbvio – Bart respondeu – Praticamente ninguém chega a vir até aqui. Vamos andando! Temos que chegar ao tesouro antes que Shakhan chegue aqui.
Seguiram adiante, um corredor em forma de ‘U’ e depois rumo a uma porta fechada. Na sala posterior, apesar da iluminação precária, Fei não deixou de notar que havia algo familiar na porta seguinte. O entalhe na porta metálica era dividido para cada uma das partes da porta, sendo a esquerda semelhante a um anjo masculino e o da direita, um anjo feminino. Ambos com uma única asa.
_ Isso é... a mesma estátua de anjo da catedral!
_ Então, essa é a porta que leva ao grande tesouro real – presumiu Bart. E como em resposta ao que dissera, um painel eletrônico ergueu-se do piso entre ele e as portas. Havia um sensor de retina no aparelho, e todos entenderam: ali estava a fechadura da porta.
_ É hora do Jasper de Fatima... fazer sua parte... – Bart comentou, nervosamente – Ah, é, mas um dos meus está fechado...
_ Eu estou aqui.
Bart voltou-se e sorriu para Margie, enquanto a prima veio ficar ao seu lado. Após um instante, dois feixes finos de luz saíram do sensor, o esquerdo no olho direito de Bart, o direito no olho esquerdo de Margie. E, como se cada um dos anjos tivesse auxiliado o outro, as portas se abriram para revelar outro corredor. E Fei murmurou, assombrado:
_ O... Jasper de Fatima.
_ É – Bart acenou a cabeça sem se voltar – Aquele babaca, o Shakhan, confundiu isso com o pingente real.
Ele e Margie se voltaram, e Bart tinha um sorriso que era, ao mesmo tempo, alegre e triste no rosto. Sem dúvida, devia estar pensando em quando ele e Margie eram crianças, e os dois ainda eram prisioneiros de Shakhan.
_ Mas, isso facilitou um bocado pra nós, então eu fiquei com a minha boca fechada.
_ E... o que tem adiante...?
_ À frente e acima, deve estar o núcleo central da fortaleza – explicou Margie – É dito que, se fizermos brilhar aquela luz misteriosa pelos nossos olhos, a fortaleza vai se erguer até a superfície. Dizem que isso foi construído antes do país de Aveh ser fundado. E então, estão prontos para ir?
Os quatro prosseguiram, chegando a uma bifurcação. Tomando o rumo esquerdo, encontraram uma sala ampla de luzes avermelhadas, e todos olharam ao redor, Bart analisando as paredes enquanto avançava.
_ Com certeza, tem um bocado de barras e medidores por aqui.
Estavam no que parecia ser uma ponte de comando de alguma espécie, embora não fizesse muito sentido... a não ser que o que Margie comentara, sobre a fortaleza poder emergir de alguma forma, fosse verdade. E ela voltou-se para Bart com ar curioso.
_ Eu me pergunto qual é mais impressionante? A cabine do piloto na sua nave, ou essa daqui?
_ A minha nave, é lógico...
Mas os dois amigos e Margie viram que ele próprio não parecia tão convencido. Bart dissera aquilo sem convicção, e ainda olhando ao redor. Tanto que, após o primeiro instante, ele cruzou os braços e baixo o rosto, admitindo:
_ Hã, bom... já que são os nossos ancestrais, eu acho que essa aqui é melhor. E você – voltou-se para Margie – vê se pára de fazer perguntas difíceis feito essa. Seja como for, não é cabine do piloto, é ponte. Entendeu?
_ Faz mesmo diferença? – Margie perguntou, rindo do embaraço de Bart, e eles saíram dali.
Para resolverem a questão da iluminação e tornar mais simples a busca pelo tesouro oculto, eles dirigiram-se para o bloco de energia do mausoléu onde, depois de subirem ao segundo andar e encontrarem uma série de corredores circulares, eles acabaram por encontrar mais uma tranca composta de duas estátuas de anjos, onde mais uma vez Bart e Margie fizeram funcionar o Jasper de Fatima. Nenhuma porta abriu-se desta vez, no entanto.
_ Estranho – comentou Billy – As trancas do Jasper se mantiveram desta vez...?
_ Ou abriram uma passagem em outro lugar – comentou Bart – Vamos, tem mais umas portas por aqui que a gente não verificou ainda.
Encontraram o que procuravam numa passagem a sudeste, que os levou a um imenso salão escuro. Durante a investigação do andar tinham estado em várias salas das mesmas proporções e aparentemente sem qualquer outra saída; aquela, no entanto, não tinha o grande pilar central que as outras tinham, e uma passagem estava aberta a norte.
_ Essas portas... são imensas – Fei admirou-se.
_ É... Grandes demais pra seres humanos – Bart concordou, pensativo – Vamos dar uma olhada aí dentro.

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