domingo, 14 de fevereiro de 2016

Capítulo Trinta e Cinco Ponto Um

(...)

O salão oculto depois da porta também estava às escuras, mantido apenas por iluminação de emergência. Mas mesmo à meia-luz era possível divisar o que se encontrava no final do corredor por onde os quatro entraram; algo semelhante a um trono imenso, com uma figura humanóide à sua altura para ocupá-lo. Uma figura imensa e vermelha, um Gear, que possuía uma espécie de dignidade imponente que deixou aos quatro mudos por um momento.
_ I-isso...! – murmurou Billy.
_ ... Meio que parece um bocado com o Gear do Bart – comentou Fei, numa atitude pensativa que lembrava muito o olhar crítico de Citan. E Bart, como se despertasse, concordou:
_ Hã? Ah, é... Agora que você mencionou... Bom – deu de ombros – Se traçar a história do meu Brigandier, era um Gear feito originalmente em Aveh, que eu personalizei. Não ficaria surpreso se houvesse alguma conexão.
Os quatro permaneceram olhando para o imenso Gear em seu trono. Mesmo desativado por tanto tempo, ele mantinha uma espécie de atmosfera de poder à sua volta. Era de se entender, agora, por que havia sido dito que o tesouro não deveria ser utilizado a menos que uma grande necessidade se erguesse. Talvez Bart, em sua admiração, tenha se apercebido de repente de que não estavam ali apenas para olhar para ele, porque foi o primeiro a se recuperar da surpresa.
_ É, então... Parece que não tem energia nenhuma nessa área, exceto a das luzes de emergência.
_ Esse Gear também... – Fei concordou – Sem energia nas luzes. A unidade de impulso foi selada.
_ Hmm – fez Bart – Os painéis de controle lá embaixo não fizeram muita coisa... Quer dizer que provavelmente tem alguma coisa por aqui.
Espalharam-se para procurar um meio de ativação do Gear na plataforma onde ele estava, e foi Bart quem encontrou algo entre as pernas dele.
_ Hein...? Pessoal, tem alguma coisa escrita aqui. Alguém aí tem uma luz? – Fei passou-lhe uma lanterna e Bart estreitou o único olho para ler – Peraí... Tá escrito em Fatima antigo... É dos meus ancestrais.
_ O que diz? – perguntou Margie, e Bart traduziu:

Paz a todos aqueles que vierem aqui. Temendo grande calamidade, nós selamos este legado, confiando seu destino a vocês.

Como se esperasse apenas por aquilo, toda a área de repente pareceu ganhar vida. O salão do trono do Omnigear iluminou-se, deixando a imensa figura visível. Era realmente parecido com o Brigandier, mas não tinha tampão sobre qualquer dos visores e possuía uma crista amarela sobre seu capacete.
A energia ativou-se em toda a instalação; dos salões inferiores dos elevadores à ponte de comando que tinham encontrado anteriormente, a iluminação parca de emergência cedeu lugar a um sistema plenamente ativo que parecia nunca ter sido desligado. Na plataforma diante do imenso Gear de seus ancestrais, Bart esfregou as mãos com entusiasmo.
_ Beleza, isso deve resolver!
_ Agora – Margie perguntou, olhando para o primo – como é que eu levo isso pra fora?
_ É.
_ Vocês disseram que ele apareceria na superfície se lesse os olhos – lembrou Billy – Acham que podem mover esse prédio inteiro?
Bart e Margie se entreolharam. Bem, o mausoléu tinha uma ponte de comando, afinal. Valia a pena tentar.
_ Tá, vamos voltar lá pra baixo e fazer um teste.
Mas enquanto os outros desceram, Bart deteve-se ainda um instante diante do Omnigear de seus ancestrais e comentou em voz baixa, como se houvesse mais alguém ali:
_ Pai... Parece que vamos ter que fazer isso se mexer. Desculpa, mas eu vou pegar ele emprestado.
O Omnigear vermelho continuou inerte, e Bart quase se decepcionou com isso. De algum lugar, talvez ele esperasse por uma resposta.
Voltaram todos à ponte de comando no andar inferior, agora ativa com energia, e Bart animou-se ao olhar para os instrumentos.
_ Legal! Vamos ver como meus ancestrais trabalhavam, então... – tomou lugar numa poltrona – Isso parece pra caramba com o painel da Yggdrasil... Se eu fizer isso...
Abaixo, sob o nível onde os elevadores estavam instalados, um imenso mecanismo voltou à vida, um anel propulsor que despertou girando depressa e colocou toda a estrutura em que estavam em vibração, e deixou Bart ainda mais animado.
_ Beleza! Eu sei que consigo fazer isso! Segura aí, gente!
Subitamente, lá em cima, toda uma planície entre as montanhas estremeceu e um imenso disco platinado começou a erguer-se aos céus. O ‘mausoléu’ de Nisan era na verdade uma imensa estação de batalha dos tempos antigos, onde os primeiros reis da dinastia planejavam ocultar seus súditos em uma situação extrema; como nunca mais fora utilizado de forma ativa, nem mesmo os registros mais antigos da cidade poderiam dar qualquer pista sobre seu verdadeiro formato e propósito. E Bart, na poltrona de comando, exultou:
_ Nós emergimos! Em seguida, abrir o domo celeste.
Um som estranho de zumbido se fez ouvir quando Bart ativou o painel para abrir o domo superior da fortaleza, e o pirata olhou para a esquerda do amplo painel e depois à direita.
_ ... Hã? O quê?
_ Bart, o que foi? – perguntou Fei, e Bart continuou a olhar para os comandos sob suas mãos.
_ Hein...? Não, já tá se movendo.
_ Provavelmente, por causa da sua pilotagem habilidosa – comentou Billy com ironia, mas Bart o ignorou desta vez, tão perplexo estava.
_ Não... Não é por isso.
Uma abertura circular abriu-se na proa da fortaleza móvel e uma reação de energia intensa mobilizou-se ali, um canhão antigo de plasma. E, mediante o olhar surpreso de todos, Bart murmurou baixinho:
_ Sem dúvida... é alguma coisa que eu ativei por acidente...
Um disparo de energia maciça brotou da fortaleza, carbonizando completamente a área diante de si e, felizmente, tomando o rumo do oceano e sem atingir nada. Os demais fizeram silêncio, imaginando o quanto Bart devia estar envergonhado com mais aquela mancada. Ao invés disso, o líder dos piratas de repente socou o ar, empolgado:
_ Maneiro!! É isso aí!!
_ Ah, sério...? – os três retrucaram, olhando para ele com ar vazio.
_ Quê? Do que vocês tão falando?
_ Pára de brincar! – Fei bronqueou – Afinal, o que raios você acabou de disparar?
_ Ah... – Bart olhou ao redor – Bom, eu não diria que foi um sucesso completo... mas vai servir por enquanto.
_ Aquilo era um canhão de ondas... – murmurou Billy, mas Bart não parecia ter levado isso a sério.
_ Nah, não esquenta! Me diz aí, alguma vez já me viu meter os pés pelas mãos, hein? Fala aí, já viu?
Uma resposta não era necessária, principalmente para quem olhava para Fei, que já tivera duas experiências com Bart e suas armas. Mas Bart, como sempre, estava empolgado demais para dar conta.
_ Então, que tal... Senhoras e senhores, contemplem!
E ativou o monitor principal da fortaleza, que imediatamente mostrou o oceano. Azul sobre azul, com um vulto imenso e escuro mal definido na imagem. E Bart, curioso, pareceu reconhecer aquilo.
_ Ei, aquilo ali por acaso não é a Torre de Babel... Bem pra lá?
Voltou-se na poltrona para os colegas, com um sorriso que parecia um quarto de lua.
_ E aí? Não é ma-nei-rís-si-mo?! Essa gracinha flutua por causa do Jasper de Fatima... Vou chamar ela de Forte Jasper, e vocês vão poder ver ela de longe! Tenho certeza que aquele último disparo de canhão podia alcançar qualquer lugar! Então... Acho que eu queria mostrar pra todos vocês toda a grandiosidade dela. Já viram um canhão desses antes? E sem essa de comparar com aquele arminha de feijão do Vanderkaum; esse aqui é muitas vezes mais poderoso e muitas vezes mais refinado...
Todos continuavam olhando com ar vazio; naquela empolgação, Bart parecia um vendedor com seu novo lançamento, ou pior ainda, uma criança com um brinquedo novo. Ele não parava mais de falar.
_ Afinal, é por isso que meus ancestrais usaram ele por gerações pra proteger o tesouro. É, esse aqui é pra valer mesmo. E não se esqueçam disso. Agora, como eu estava dizendo, eu nunca meti os pés pelas mãos antes.
E olhou ao redor, sorrindo largamente e quase parecendo tentá-los a dizer o contrário. Esfregando as mãos uma na outra novamente, ele concluiu.
_ Então, vamos pegar esse tesouro e ir pra casa! Mas primeiro, temos que abrir aquela porta do domo! Mas... não acho que o botão deste painel de controle vai servir. Pra lá!
O silêncio dos três enquanto Bart disfarçadamente se mudava de poltrona dizia mais do que palavras. Ele já tinha demonstrado bem claramente que aquele não era o botão certo, e Fei comentou em voz neutra:
_ Você não acabou de dizer que tinha apertado o botão errado?
_ Ah, eles são todos parecidos. Bom, que seja, vamos começar a apertar uns botões.
_ Ô, espera um pouco! Isso é seguro?!
Desta vez, no entanto, o domo sobre o Forte Jasper abriu-se ao comando de Bart, que se voltou para os amigos com ar satisfeito.
_ Beleza. Agora, vamos nos apressar e levar o tesouro pra fora.
_ Bom trabalho, Príncipe Bartholomew – uma voz familiar se fez ouvir de repente, chamando a atenção de todos – Obrigado por liberar o selo.
_ Essa voz... Shakhan!
A voz de Shakhan veio pelo sistema de comunicações de repente, enquanto vários Gears entraram pelo domo recém-aberto do Forte Jasper, cada um tomando posição. Vários Gears Etones, alguns soldados menores e um imenso Gear esférico com uma base flutuante, que lembrava vagamente o Alkanshel de Stone. E Bart praguejou ao ver a invasão.
_ Miserável! Foi tudo uma armação, então?
_ É claro – respondeu Shakhan – Você não acreditava de fato que a porta se abriria para qualquer pessoa? Eu simplesmente deixei a informação vazar e aguardei com calma pela sua chegada.
_ Saco... Então foi por isso que eu não percebi o seu fedor até agora!
_ Conhecendo sua natureza impulsiva, eu sabia que você viria. Mas nunca pensei que você iria longe a ponto de romper o selo para mim.
_ Filho de uma... – Bart esmurrou o painel de frustração – Me fazendo de otário!
_ Meus soldados já garantiram esta área – Shakhan concluiu entre dentes – Se não gosta disso, venha até aqui e leve o seu! Hah hah hah!
_ Demorou, seu velho careca! – Bart levantou-se da poltrona, correndo para fora – Aguenta aí, que eu já tô chegando! Billy, Fei, vamos lá!
_ Eu vou também!
Outra vez Bart teve que conter o impulso de mandar Margie ficar para trás. Não havia muita segurança em lugar algum até que pusessem Shakhan e seus homens para fora, e a última coisa que ele havia de querer era que Margie fosse capturada novamente.

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